sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Carta do Zé agricultor ...

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Pode-se comparar a matéria abaixo a uma versão popular do conteúdo do livro "Agropecuária - Atividade de alto risco" dos jornalistas Nelson Ramos Barretto e Paulo Henrique Chaves.
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... para Luís da cidade

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A carta abaixo - adaptação de Barbosa Melo - foi escrita por Luciano Pizzatto, engenheiro florestal, especialista em direito sócio ambiental e empresário, diretor de Parque Nacionais e Reservas do IBDF-IBAMA 88-89, detentor do primeiro Prêmio Nacional de Ecologia. Este Blog também adaptou alguns pontos do textos.
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Prezado Luis, quanto tempo. Eu sou o Zé, teu colega de ginásio noturno, que chegava atrasado, porque o transporte escolar do sítio sempre atrasava, lembra né? O Zé do sapato sujo!
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Tinha professor e colega que nunca entenderam que eu tinha de andar a pé mais de meia légua para pegar o caminhão por isso o sapato sujava.
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Se não lembrou ainda eu te ajudo. Lembra do Zé Cochilo?... Hehehe, era eu. Quando eu descia do caminhão de volta pra casa, já era onze e meia da noite, e com a caminhada até em casa, quando eu ia dormi já era mais de meia-noite.
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De madrugada o pai precisava de ajuda pra tirar leite das vacas. Por isso eu só vivia com sono. Do Zé Cochilo você lembra né Luis?
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Pois é. Estou pensando em mudar para viver ai na cidade que nem vocês. Não que seja ruim o sítio, aqui é bom. Muito mato, passarinho, ar puro...
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Só que acho que estou estragando muito a tua vida e a de teus amigos ai da cidade. Tô vendo todo mundo falar que nós da roça estamos destruindo o meio ambiente.
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Veja só. O sítio de pai, que agora é meu (não te contei, ele morreu e tive que parar de estudar) fica só a uma hora de distância da cidade.

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Todos os matutos daqui já têm luz em casa, mas eu continuo sem ter porque não se pode fincar os postes por dentro uma tal de APPA que criaram aqui na vizinhança.
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Minha água é de um poço que meu avô cavou há muitos anos, uma maravilha, mas um homem do governo veio aqui e falou que tenho que fazer uma outorga da água e pagar uma taxa de uso, porque a água vai se acabar. Se ele falou deve ser verdade, né Luis?

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Pra ajudar com as vacas de leite (o pai se foi, né...) contratei Juca, filho de um vizinho muito pobre aqui do lado. Carteira assinada, salário mínimo, tudo direitinho como o contador mandou.
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Ele morava aqui com nós num quarto dos fundos de casa. Comia com a gente, que nem da família.
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Mas vieram umas pessoas aqui, do sindicato e da Delegacia do Trabalho, elas falaram que se o Juca fosse tirar leite das vacas às 5 horas tinha que receber hora extra noturna.
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E que não podia trabalhar nem sábado nem domingo, mas as vacas daqui não sabem os dias da semana ai não param de fazer leite. Ô! Bichos aí da cidade sabem se guiar pelo calendário?

(Continua amanhã...)


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