Realidade ignorada
A história de Élcio Evangelista deixa mais palpáveis os problemas da lei,
Depois de quase 30 anos, seu Élcio conseguiu comprar uma pequena propriedade que produz 50 sacas de café por ano e deu adeus ao trabalho da roça na terra dos outros.
Deixou de ser um camarada, que é como se chamam em Minas os roceiros que não possuem terras e ganham a vida trabalhando aqui e a ali.
No meio de uma íngreme encosta, como todas as outras fazendas de café da região de Cabo Verde (MG), a fazenda do seu Élcio torna mais fácil compreender o conceito de área de preservação permanente (APP).
O termo tem se popularizado no debate sobre a reforma do Código Florestal, sobretudo em mesas redondas, audiências e estudos.
É fácil entender o que é uma APP na fazenda de Élcio porque a propriedade é ela toda uma APP.
Todas as beiras de cursos d’água são APPs e precisam ser protegidos por no mínimo 30 metros de vegetação em cada margem.
Isso é o que diz o Código atual, e também o que diz o projeto de lei do novo Código que tramita no Senado.
A questão é que na pequena fazenda do seu Élcio, com seus pés de café plantados há mais de 60 anos, nascem três minas d’água e correm dois riachos.
As APPs de toda essa água se entrelaçam e correspondem a praticamente toda a fazenda, que tem apenas 1,6 hectares de cafezais.
Pelas contas da Cooxupé, a cooperativa à qual o seu Élcio é associado, cumprir o Código Florestal significaria, no caso dele, recuperar a vegetação nativa de toda a propriedade e abandonar a atividade produtiva.
“O jeito seria ir pra cidade, mas eu não sei fazer nada lá. Toda a vida só mexi com roça, não sou pedreiro, marceneiro, açougueiro, nada.
O projeto de lei do novo Código Florestal mantém as exigências atuais para as APPs, mas pode regularizar a situação de Élcio.
A proposta é que as pequenas propriedades, com até quatro módulos fiscais, sejam liberadas da obrigação de recompor as APPs desmatadas no passado.
No caso da propriedade do seu Élcio, esse desmatamento ocorreu antes mesmo do Código Florestal atual entrar em vigor, em 1965.
O agricultor se mostra preocupado com a preservação do meio ambiente e com a insegurança gerada por estar em desacordo com a lei ambiental.
No fim das contas, o caso do seu Élcio acaba tornando reais e palpáveis os problemas que já existem, mas que muitas vezes ficam distantes do debate público sobre a reforma do Código Florestal.
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