terça-feira, 24 de julho de 2012

Os falsos quilombolas invadem...




...até terreno da marinha

'Os militares infernizam a nossa vida', diz quilombola sobre disputa por terra
Um conflito há quatro décadas gera impasse entre descendentes de quilombolas e a Marinha na região do rio dos Macacos, em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador (BA). 
Desde que a Marinha, em 1972, inaugurou na área a Vila Naval da Barragem, bem próxima da Base Naval de Aratu - onde a presidente Dilma Rousseff passa as férias - a vida dos moradores descendentes de escravos da região é manchada de sangue, dizem eles.
Uma área de 300 hectares é disputada entre quilombolas e a força naval. A representação baiana do INCRA elaborou um Relatório Técnico que atesta ser aquela uma região que, no passado, abrigava um quilombo. 
A Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultura, já considera a área um antigo quilombo.
"O laudo do nosso relatório reconhece que a região do rio dos Macacos era mesmo um quilombo. Na próxima terça-feira (24), poderemos fazer um ato com os moradores da região", afirmou Cláudio Bonfim, analista do Incra
Para terminar o laudo, servidores do instituto interromperam a greve do órgão no Estado, deflagrada em 26 de junho.
O documento vai ser remetido a Brasília, onde se espera que seja publicado no Diário Oficial da União (DOU) e assinado por Dilma Rousseff. 
Como a Constituição Federal, no artigo 68 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, determina que aos quilombolas seja dada "a propriedade definitiva das terras ocupadas, cabendo ao Estado emitir-lhes os respectivos títulos".
Se tais ações forem feitas, a liminar da justiça baiana que pede, a partir de 1° de agosto, a reintegração de posse à Marinha perde efeito.
O acesso ao rio dos Macacos é feito pela Base Naval. O iG foi barrado pela guarda, assim como, momentos antes, uma kombi da prefeitura de Simões Filho teve impedido o seu acesso até lá. 
O veículo do município carregava 50 cestas básicas, de 18 quilos cada, para as 46 famílias que moram na regiãoem litígio. Quem quisesse buscar o seu alimento teria que percorrer seis quilômetros - distância entre as moradias da comunidade e a portaria.
A presidente da Associação Quilombola Rio dos Macacos, Rose Meire dos Santos Silva, relata uma série de abusos que atribuiu à Marinha. Ela se diz analfabeta porque essa força militar impediu o seu acesso à escola.

"Os militares infernizam a nossa vida, nos ameaçam, querem nos expulsar daqui. Impedem a entrada de atendimento médico e intimidam a nossa comunidade. A Marinha nos impede de trabalhar, quando veem pessoas trabalhando na roça, as espancam. já ocorreram muitas mortes, inclusive por omissão de socorro. Não temos o direito de ir e vir. É um verdadeiro massacre, uma ditadura", afirma Rose Meire.
De acordo com ela, há condições de se abrir uma outra estrada, para que os moradores da localidade não precisem mais atravessar a cancela da força naval.
Ela também reivindica luz, saneamento básico, água, entre outros serviços inexistentes em rio dos Macacos.
Rose Meire diz que seus vizinhos estão deprimidos e que sua avó, Maurícia Maria de Jesus, de 112 anos, foi agredida verbalmente pelos marinheiros. 
Um dos moradores, Rose Meire diz, Antonio Alexandrino, 75 anos, morreu na ultima terça-feira (17), após ouvir uma moradora da Vila Naval dizer que a Marinha iria despejar os quilombolas.
Se for comprovada essa morte e outra ocorrida em março de 2011, podem ser suspensos na Justiça processos que ordenam a retirada dos moradores daquele terreno, já que a legislação prevê a suspensão processual em caso de óbito de uma das partes. 
Essa explicação é da Defensoria Pública da União, que acompanha o caso de rio dos Macacos pelo defensor público Átila Ribeiro Dias.
Em 31 de maio deste ano, o poder judiciário federal atendeu à ação da Marinha e ordenou a paralisação de construção, reformas e melhorias dos imóveis de Rio dos Macacos. 
Três dias antes, moradores da área afirmaram que militares armados impediram a reconstrução de uma moradia que foi ao chão pelas chuvas.
"Ali, as casas são de taipa e barro, têm poucos tijolos. A Marinha negou a possibilidade de melhorias nos imóveis, e a Justiça acatou. Entramos com ação que permita a requalificação dessas casas", disse o defensor Dias.
Também morador do rio dos Macacos, Ednaldo Bispo dos Santos é outro a fazer uma série de queixas. "Passamos por muito sofrimento. 

Estamos proibidos de pescar e plantar, colocam pesticidas no nosso arvoredo. Matam nossos animais. É uma opressão grande demais. Eles grampeiam os nossos celulares. São uns capitães do mato", reclamou.

Após tomar conhecimento de relatos de abuso, o Ministério Público Federal da Bahia (MPF), no último 1° de junho, expediu recomendação ao comando do 2° Distrito Naval, sediado em Salvador, recomendando a proibição de constrangimento físico ou moral contra os moradores da terra disputada judicialmente.
O MPF quer que o comando "exerça o controle e a fiscalização efetiva dos atos praticados por oficiais da unidade. A procuradoria já havia aberto inquérito civil público para "apura possíveis ilegalidades praticadas por militares" contra os quilombolas.
No início de junho, uma comitiva da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal esteve em Rio dos Macacos para ver a situação daquela comunidade. 
Na ocasião, o presidente da comissão, deputado Domingos Dutra (PT-MA) afirmou se tratar de "crime contra a humanidade". Os congressistas não descartaram levar as denúncias de abusos às comissões de direitos humanos da ONU e da OEA.
De acordo com relatório do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra, a área era, há mais de cem anos, a fazenda Macacos, um engenho de Coriolano Bahia. 
Ele prometeu dar a propriedade das terras aos seus empregados - o que não ocorreu formalmente. Com a saída do fazendeiro, quem estava lá herdou, na prática, aquela região e seus bens. 
Contudo, por deixar dívidas tributárias junto a Salvador, Simões Filho se apropriou de partes da terra e, em 1960, doou a área para os militares. Há ainda registros de que os escravos habitavam as terras há 238 anos.
Em nota, a Marinha afirma que os moradores da comunidade ocupam irregularmente terra da União, que tal área é estratégica para a defesa nacional, que a reintegração de posse de terreno visa também preservar os mananciais da região. 
Ainda segunda a força militar, como o assunto está judicializado, os moradores não podem realizar intervenção em seu imóvel sem autorização judicial. Por fim, a Marinha afirma que o tratamento dispensado aos moradores sempre foi respeitoso e humano.

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