Imbróglio indígena
Cesário Ramalho da Silva
Uma verdadeira indústria de
demarcação de terras supostamente Indígenas está em curso no Brasil. A cargo da
Funai, esse processo espalha insegurança jurídica, ameaçando o Estado de
Direito e consequentemente a soberania e o futuro do País.
O complexo
quadro vigente é fruto de um imbróglio jurídico criado pelo próprio Estado ao
longo dos anos, e tanto o governo atual quanto os produtores proprietários de
terras escrituradas, os índios, e a sociedade em geral são vítimas.
Segundo o
IBGE, o Brasil tem hoje 14,69% do território com áreas Indígenas para
aproximadamente 817 mil índios. Os 5,2 milhões de propriedades rurais ocupam
38,8% do País. Segundo a Frente Parlamentar Agropecuária, a Funai pretende
criar mais 611 reservas, fazendo a área pertencente aos índios chegar a 25% das
terras brasileiras.
É preciso
evitar a polarização ideológica e equivocada de que há um conflito entre o
agronegócio e os índios. Abordar a questão assim é adotar uma postura leviana e
distorcida. Governos passados concederam títulos de terras a não Indígenas em
áreas hoje reivindicadas como pertencentes aos índios. Estas famílias de não
Indígenas, detentoras legais das propriedades em que vivem e trabalham há três,
quatro gerações, não podem ser penalizadas.
Hoje, uma
comunidade depende apenas da declaração de seus integrantes e de um laudo
antropológico para ser considerada indígena. No entanto, um processo
demarcatório coerente precisa passar por estudos antropológicos sérios,
documentados, não enviesados, que contemplem o parecer de outras instituições -
não só a Funai.
Retirar não
Indígenas que têm o título de propriedade de suas áreas expedido pelo Estado de
terras supostamente habitadas por índios seria apenas trocar o problema de
lugar.
É óbvio que,
caso as titularidades não forem comprovadas, a lei - devolvendo áreas aos
índios - deve ser cumprida, como apregoa a Constituição. Mas, se existe outro
direito preconizado na Carta Magna, ele se refere à legitimidade do Direito de
Propriedade.
É necessário
também restabelecer a Portaria 303, editada pela AGU, que normatiza o regime
jurídico para a demarcação e gestão de reservas Indígenas. A norma estende a
todos os processos as 19 condicionantes definidas pelo STF no julgamento da
demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol. Aguarda-se tão somente a publicação
do acórdão - adiada, entre outras coisas, pela demora na nomeação do novo
ministro do STF - para que a portaria volte a valer.
A portaria
trata das salvaguardas institucionais às reservas Indígenas e determina que
todos os órgãos públicos federais sigam o que o STF decidiu. Mas a autoridade
do STF como instância máxima está sendo ignorada por ONGs e movimentos ditos
sociais. Esses grupos não agem em favor do direito dos índios, atuam em prol de
quem os financia, em muitos casos, entidades estrangeiras. Vivem da perpetuação
do problema.
É importante
também um debate lúcido no Congresso referente à PEC 215, que propõe passar
para o Legislativo o processo de demarcação de reservas Indígenas. Soma-se a
isso especial atenção para o projeto de lei que trata da exploração de recursos
naturais e obras nas reservas.
Para
concluir, cito pesquisa da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do
Brasil, que mostra que os índios estão integrados ao modo de vida urbano.
Eletrodomésticos e eletroeletrônicos estão presentes nas aldeias e o principal
problema enfrentado pelos índios, segundo eles mesmos, é o acesso à saúde.
Cerca de 64%
deles recebem o Bolsa Família e 67% gostariam de cursar uma faculdade. O
levantamento revela que, para os índios, energia elétrica, água encanada, rede
de esgoto e casa de alvenaria são muito importantes.
Qual leitura
que podemos fazer? Que o índio não quer o isolamento, e sim assumir seu papel
como cidadão, com direitos e obrigações. A preservação das tradições Indígenas
pode perfeitamente caminhar de mãos dadas com ganhos de cidadania.
*Presidente da Sociedade Rural Brasileira.
Fonte: OESP, 22 de junho de 2013
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