Menos líderes,
mais povo
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Eliane Cantanhêde
Uma das grandes dificuldades num
momento tão grave é a falta de lideranças para discutir saídas e construir
consensos contra a crise. Negociar o quê? Com quem?
No Congresso, até o presidente da
Câmara e o do Senado, segundo e terceiro na lista de sucessão, estão sendo
investigados pelo Supremo. Cadê os Ulysses Guimarães?
Na Igreja, foram-se os tempos de d.
Paulo Evaristo Arns, d. Luciano Mendes de Almeida, d. Eugênio Sales, d. Lucas
Neves. Que cardeal tem hoje essa dimensão? (E o bispo Macedo se dando bem...)
Na OAB, na ABI, onde se escondem os
Barbosa Lima Sobrinho, os Raymundo Faoro, os Evandro Lins e Silva? Bem, na UNE
nem se fala mais.
Nas centrais sindicais, sobram o
alinhamento automático da CUT ou o histrionismo imprudente da Força Sindical.
Não se fazem mais Lulas como antes.
E no empresariado? Um Jorge Gerdau,
que poderia ser de grande valia numa roda de negociações, confundiu-se com o
governo. Um Paulo Lemann está olhando mais para fora do que para dentro do
País. Paulo Skaf tem estatura para o momento?
Até nas Forças Armadas falta um
general Leônidas Pires Gonçalves que ouça acertos democráticos e propague para
seu público interno. Está cada um na sua.
Sem líderes que apontem o futuro,
destacam-se Fernando Henrique Cardoso, o maior líder da oposição, e Luiz Inácio
Lula da Silva, o patrono do governo Dilma Rousseff, que faz água para todo
lado.
O pronunciamento de domingo foi uma
tragédia no conteúdo e na forma. Usar o Dia da Mulher, com um blazer verd-
bandeira e sorrindo como se estivesse tudo na santa paz, para repetir o
blá-blá-blá de crise internacional e pedir paciência? Com o grau de irritação
da sociedade, é claro que haveria um panelaço, servindo como convocação para a
manifestação de 15 de março.
Nessa crise, só falta um fator: a
rua. Sociólogo, ex-presidente e ex-senador, FHC diz que é hora de os líderes,
ou o que resta deles, observarem e analisarem. "A rua, neste momento, não
é dos partidos, é do povo."
É um equilíbrio delicado. Os partidos
de oposição nem podem capitanear o "Fora, Dilma" nem podem virar as
costas para o protesto popular. E se as manifestações encorparem?
Assumir a dianteira do "Fora,
Dilma" seria leviano, porque não se parte para uma aventura dessas sem ter
o "day after" predefinido e não há líderes (no Congresso e na
sociedade) com dimensão para articular consensos. Empurrar Dilma rampa abaixo
para pôr quem e o que no lugar?
Mas também não dá para assistir ao
estouro da boiada de camarote e lavar as mãos. A sociedade passaria por cima
dos líderes e dos partidos, com risco de uma guerra campal entre os contra e os
a favor de Dilma.
Atenção a um trecho da entrevista de
FHC ao Estado. Depois que ele descartou o afastamento já de Dilma,
perguntei: "E se as manifestações forem num crescendo, o sr. não vê
horizonte de impeachment?" Ele deixou implícito que a coisa pode mudar de
figura: "Eu não posso dizer que seria impossível, porque as coisas não são
assim em política". Leia-se: depende do "povo".
Cada um com seus dilemas. Se pudesse,
Lula também teria ido para a janela bater panela, reclamar da economia, da
desagregação política, da desconstrução do seu legado. Mas Dilma é o PT no
poder e o que interessa para Lula é o PT.
FHC e Lula já ensaiaram algumas
conversas, mas os emissários, como o ministro José Eduardo Cardozo e o faz-tudo
do PT Sigmaringa Seixas, vão e voltam de mãos vazias. Se não dá para conversar
com Lula, talvez FHC pudesse conversar com Dilma. Mas, se ela não ouve nem Lula,
por que ouviria FHC?
Moral da história: faltam líderes e
os que sobram não se entendem. A crise continua.
Dúvida. Quer dizer que os mais bem informados, com mais
noção da crise, não podem se manifestar? Só os "cumpanheiros" podem?
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