Agricultura lidera
preservação no Brasil
Ninguém preserva
mais a vegetação nativa do que os produtores rurais
Evaristo de
Miranda
Grande produtor de
alimentos, energia e fibras, o Brasil é uma potência em preservação ambiental,
com mais de 66% de seu território recoberto por vegetação nativa. E esse número
sobe para quase 75% quando agregadas as áreas de pastagem nativa do Pantanal, do
Pampa, da Caatinga e dos Cerrados. Toda a produção de grãos (milho, arroz,
soja, feijão...), fibras (algodão, celulose...) e agroenergia (cana-de-açúcar,
florestas energéticas...) ocupa 9% do País. Os agricultores preservam mais
vegetação nativa no interior de seus imóveis (20,5% do Brasil) do que todas as
unidades de conservação juntas (13%)!
Esses dados, da
Embrapa, resultam principalmente das informações tabuladas do Cadastro
Ambiental Rural, o CAR, criado pela Lei 12.651/12, o novo Código Florestal, que
acaba de completar cinco anos. Mais de 4,1 milhões de imóveis rurais, somando
uma área superior a 410 milhões hectares, estavam cadastrados no Serviço
Florestal Brasileiro até maio de 2017.
Os agricultores
informaram detalhadamente, num mapa com base em imagens de satélite e em
diversas fichas, todo o uso e ocupação de suas terras, em conformidade com o
Código Florestal. É como se ao declarar o Imposto de Renda o contribuinte
informasse a planta da casa, a disposição de cada móvel, o uso de cada cômodo e
ainda, na Amazônia, por exemplo, deixasse claro que não utiliza 80% de seu
apartamento a título de reserva legal. E que cuida de tudo e paga impostos,
mesmo sobre o que lhe é vedado usar.
Em 1.º de fevereiro
publicamos no jornal O Estado de S. Paulo os primeiros resultados do CAR
(Cadastro Ambiental Rural: a hora dos fatos). Agora, os dados finalizados pela
Embrapa demonstram o papel único da agropecuária na preservação ambiental.
No Sul, as unidades
de conservação e as terras indígenas, juntas, protegem 2%, enquanto os
produtores preservam 17% da região nos imóveis rurais. As áreas preservadas
pelos agricultores superam em mais de oito vezes as protegidas. Considerando
apenas a área agrícola, os produtores preservam 26% das terras, número bem
superior à exigência do Código Florestal.
No Sudeste, ainda
sem disponibilidade dos dados do Espírito Santo, os produtores preservam um
território equivalente a 17% da região, em vegetação nativa e ecossistemas
lacustres e palustres. Já as áreas protegidas equivalem a 4%. Na área rural,
eles preservam 29% de suas terras, também bem acima da exigência do Código
Florestal.
No Centro-Oeste,
ainda sem disponibilidade dos dados de Mato Grosso do Sul, os produtores
preservam em seus imóveis um território equivalente a 33% da região, ante 14%
em áreas protegidas. Mais uma vez, no conjunto da área agrícola, os produtores
preservam um porcentual superior à exigência do Código Florestal: 49% das
terras, praticamente a metade.
No Norte, no Estado
do Tocantins a agricultura preserva o dobro da área total de unidades de
conservação e terras indígenas: 20% ante 10%. E em seus imóveis os produtores
apresentam uma taxa de preservação da vegetação nativa de 56%! Esse é o único
Estado da região não inserido integralmente no bioma Amazônia. Nos Estados
amazônicos a proteção ambiental é muito abrangente: 71% do Amapá, 53% do
Amazonas e 50% do Pará – além de amplos territórios recobertos por floresta
tropical em terras devolutas.
No Nordeste,
estima-se que apenas 36% dos imóveis rurais se tenham cadastrado no CAR. Isso
limita a interpretação do uso das terras. Mas basta para indicar o papel dos
agricultores na preservação da vegetação. Na maioria dos Estados nordestinos,
os produtores preservam mais de 50% da área de seus imóveis, quando a exigência
é de 20% (salvo em parte do Maranhão). A área preservada por essa parcela de
agricultores cadastrados já representa cerca de 20% da região, enquanto as
áreas protegidas conservam menos de 10%. É provável que os agricultores
nordestinos preservem três vezes mais territórios na Mata Atlântica, na
Caatinga e nos Cerrados do que todas as unidades de conservação e terras
indígenas da região, juntas.
E se ao total das
áreas de vegetação nativa preservada forem agregadas as pastagens nativas?
Ninguém plantou a vegetação do Pantanal, do Pampa, da Caatinga, dos Cerrados e
dos campos de altitude exploradas de forma sustentável pela pecuária. Essa
vegetação nativa é mantida em equilíbrio pela pecuária há séculos. Com essa
vegetação conservada se chega a quase 75% do território nacional.
Não há, no Brasil,
nenhuma categoria profissional – minerador, médico, professor, industrial,
militar, promotor, economista ou funcionário – que preserve tanto o meio
ambiente como os agricultores. Salvo na Amazônia, não existe nenhuma
instituição, secretaria de Estado, órgão federal ou estadual, empresa privada
ou organização não governamental que preserve tanta vegetação nativa como os
produtores rurais. E contra os quais – pasmem! – algumas instituições ainda
pretendem organizar uma verdadeira “inquisição informatizada” para analisar a
situação ambiental de cada um no Programa de Regularização Ambiental (PRA), que
sucederá ao CAR.
Esse enorme esforço
de preservação nos imóveis rurais beneficia toda a Nação. A responsabilidade e
os custos decorrentes da imobilização e da manutenção dessas áreas recaem
inteiramente sobre os produtores, sem contrapartida da sociedade,
principalmente dos consumidores urbanos. A Embrapa calculará o valor e o custo
de toda essa área imobilizada. Desde 1990 se fala em pagar por serviços
ambientais. Esse conto de fadas até hoje não foi efetivado. Cidadãos estão
dispostos a protestar pelo meio ambiente em zona rural, mas não cogitam de
pagar por isso. Destes os produtores esperam, no mínimo, menos demonização de
suas atividades, maior conhecimento de sua realidade e o justo reconhecimento.
É sempre bom lembrar que vilão e vileza derivam de vila, cidade.
*Doutor em
ecologia, é chefe geral da Embrapa Monitoramento por Satélite
Fonte: O Estado de
São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário