SÃO PAULO -
de Quando se olha para o desempenho da agricultura, a sensação é a que existem dois Brasis: um que anda para a frente e outro que patina.
A
agricultura e a pecuária aumentam sua produção ano a ano, sem ocupar novas
áreas, e suas exportações crescem no mesmo ritmo.
Se o resto do País - em
especial a indústria - andasse no mesmo ritmo, o Brasil estaria noutro patamar.
Mas os números mostram que a agricultura está rebocando o restante da economia
- que se arrasta como um carro com o freio de mão puxado.
Como dois setores de um mesmo País
podem se comportar de maneira tão distinta? Especialistas ouvidos pelo Estado
apontam um motivo de ordem histórica e outro geográfico. O histórico é a
relação entre esses dois setores e o Estado.
Os fabricantes de máquinas e insumos
agrícolas e os produtores se servem do setor público na forma de institutos de
pesquisa e órgãos de assistência técnica que apresentam soluções que
impulsionam sua produtividade e competitividade, observa o economista José
Roberto Mendonça de Barros. J
á a indústria, "quando tem um problema, pede
ajuda ao governo, na forma de redução de seus impostos e de aumento das tarifas
de importação". O governo invariavelmente atende, e a indústria não tem
incentivo para investir em inovação.
Na agricultura, "a inovação foi
facilitada pelas especificidades geográficas", analisa Mendonça de Barros.
"Não dá para importar tecnologia para a agricultura brasileira, que é
tropical", concorda o empresário Pedro de Camargo Neto. "É a mesma
situação do petróleo", compara Mendonça de Barros. "O Brasil
desenvolveu a tecnologia do pré-sal porque ninguém viria aqui fazer isso por
ele."
Para o economista, "a inovação
tecnológica faz parte do dia a dia dos fabricantes de insumos e máquinas e dos
produtores grandes, médios e pequenos".
Em contraste, no setor industrial,
multinacionais se instalam no País para se beneficiar do protecionismo
tarifário oferecido ao parque nacional, e adaptam-se ao ambiente de preços
altos, margens de lucro grandes e quase nenhum investimento em pesquisa e
desenvolvimento.
O resultado mais visível dessas
dinâmicas opostas - ou "interfaces díspares", como as chama Roberto
Rodrigues, coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas -
está na balança comercial.
No ano passado, o saldo comercial da agropecuária
foi de US$ 79,4 bilhões e o da economia brasileira como um todo, de US$ 19,4
bilhões. "Se não fosse o agronegócio, o saldo teria acabado há muitos
anos", estima Rodrigues, ministro da Agricultura entre 2003 e 2006.
O abismo se aprofunda mês a mês. O
saldo do agronegócio continua crescendo, mas em ritmo mais lento do que a queda
no setor industrial, do qual se originam as outras exportações.
Tanto assim
que, de agosto de 2012 a julho de 2013, o saldo comercial do agronegócio foi de
US$ 83,9 bilhões e o do Brasil como um todo, de US$ 4,5 bilhões. Significa
dizer que, sem o agronegócio, haveria um déficit de US$ 79,4 bilhões.
Produtividade. Internamente, a eficiência da agropecuária se
mede pela relação entre produção e área ocupada. De 1990 a 2011, a área
plantada de grãos expandiu 40%, enquanto a produção cresceu 220%.
Hoje a área
plantada de grãos é de 53 milhões de hectares. Se a produtividade não tivesse
aumentado, seriam necessários mais 66 milhões de hectares para produzir a atual
quantidade de grãos.
"Houve um espetacular aumento da produção sem
necessidade de desmatar", ressalta Roberto Rodrigues, que também é
produtor. "Isso mostra a sustentabilidade da nossa agricultura."
Eliseu Alves, o segundo presidente da
Embrapa, autor de um estudo sobre produtividade, destaca que ela tem crescido
de 3% a 4% ao ano. Se, de 1970 para cá, a produtividade tivesse continuado a
mesma, teria sido necessário desmatar 150 milhões de hectares para alcançar a
produção atual.
O consultor Marcos Jank apresenta
outro indicador: com a introdução da segunda safra - algo que só acontece no
Brasil, graças a uma combinação de condições climáticas e tecnologia -, a área
plantada do milho caiu de 12 milhões de hectares para 7 milhões, porque boa
parte do milho hoje é cultivada na mesma área que a soja.
Na pecuária, o número de cabeças por
hectare saltou de pouco mais de 0,8 para quase 1,2 entre 1990 e 2011 - um aumento
de 50% na eficiência.
A área ocupada pelo gado diminuiu de cerca de 178 milhões
de hectares para 172 milhões. Parte desse resultado se deve aos avanços da
zootecnia, que permitiram diminuir o ciclo de vida dos bois, dos frangos e dos
porcos.
Antes se matava o boi com quatro anos e o frango, com 90 dias; agora,
são dois anos e 60 dias, respectivamente.
Aqui, há uma dinâmica virtuosa: o
crescimento da produtividade da pecuária decorre da pressão da agricultura, diz
Marcos Jank.
O aumento dos preços globais da soja e do milho tem elevado o
valor da terra, que obriga a pecuária a obter ganhos de eficiência para
sobreviver.
Segundo pesquisa da consultoria
Informa Economics/FNP, entre o primeiro bimestre de 2003 e o último de 2012, o
preço médio da terra no Brasil aumentou 227%. A cotação média do hectare saltou
de R$ 2.280 para R$ 7.470. O preço da terra subiu 12,6% ao ano, enquanto a
inflação média anual, conforme o IGP-DI, foi de 6,4%.
Fonte: Lourival Sant’Anna - O Estado de S. Paulo
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