Feitiço invertido
Dora Kramer
Tantas o governo fez com a Petrobrás,
tanto usou e abusou politicamente da empresa que acabou criando um passivo que
pode se voltar contra seus interesses na campanha pela reeleição da presidente
Dilma Rousseff.
Demorou, mas a conta das festividades
chegou. A imagem do então presidente Luiz Inácio da Silva de macacão e mãos
lambuzadas de petróleo anunciando a autossuficiência do Brasil tendo ao lado a
ministra das Minas e Energia, apresentada como responsável pelo êxito que não
se realizou, é um contraponto constrangedor ante a realidade atual.
Perda expressiva do valor de mercado,
loteamento de cargos, manejo artificial de preços e negócios esquisitos como
esse da compra da refinaria no Texas ao custo inicial de US$ 360 milhões para
um gasto final de US$ 1,18 bilhão, são alguns dos pontos que o PT - sempre
acostumado a usar a Petrobrás para atacar os adversários - será desafiado a
explicar.
Não
espanta que a presidente Dilma, quando ministra da Casa Civil e presidente do
Conselho de Administração da Petrobrás, tenha avalizado a compra da refinaria,
conforme revelou o Estado.
Afinal, o negócio só poderia mesmo
ter sido realizado com autorização do colegiado que, de acordo com a ata da
reunião realizada em 3 de fevereiro de 2006, tomou a decisão por unanimidade.
Espantosa é a justificativa dada por
ela ao jornal. A presidente disse que foi induzida ao erro por informações
incompletas contidas em pareceres técnicos fornecidos pela diretoria
internacional da empresa.
Dois anos depois, segue esclarecendo
a assessoria do Palácio do Planalto, as informações completas vieram à tona. Se
fossem conhecidas, diz a nota, "seguramente" o negócio não teria sido
aprovado pelo conselho.
Tal esclarecimento depõe contra os
atributos de competência e austeridade da profissional Dilma Rousseff - ao
menos da forma como ela é apresentada em palanques -, além de não fazer jus à
indispensável transparência no tocante à administração pública.
Há algum tempo essa transação com a
refinaria americana vinha sendo questionada sem que o governo se desse ao
trabalho de esclarecer detalhes a respeito da decisão, deixando para fazê-lo
apenas depois de divulgado o conteúdo da ata da reunião do conselho, numa
explicação, convenhamos, obscura.
Por ela, todo o Conselho de
Administração da Petrobrás autorizou a compra de uma refinaria ignorando
cláusulas do contrato que implicariam desembolso mais de três vezes maior que o
valor original aprovado.
Fica, assim, aberta uma avenida por
onde a oposição poderá abrir alas e pedir passagem para usar o tema Petrobrás
na campanha eleitoral. O PT não terá direito a reclamar, pois foi o primeiro a
incluir o assunto na agenda eleitoral.
Agora, no entanto, a situação se
inverte, pois habituado a ter a empresa como instrumento de ataque e vanglória,
o partido estará na defensiva tentando evitar prejuízos decorrentes do uso da empresa
que tantos benefícios políticos proporcionou.
Fonte: OESP 20/3/14
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