COM – SEM – APESAR DE
Jacinto Flecha
Nos
tempos longínquos em que abrilhantei com minha presença a faculdade de
medicina, um professor mencionou doenças que se resolvem com o médico, sem o
médico e apesar do médico. Mostrou depois a utilidade de umas e outras. Não
pretendo trair segredos profissionais, mas quem conhece piadas sobre médicos
não ignora a importância dos honorários...
Prefiro abandonar depressa este assunto, pois não me convém atingir
interesses corporativistas. Também porque minhas flechas estão hoje reservadas
para o campo. Qual campo? Ora, o campo mesmo, campo propriamente dito.
Explico-me, antes que as flechas se voltem contra mim.
Todos conhecemos o êxito do agronegócio brasileiro, cuja
colheita recorde de quase 200 milhões de toneladas engorda as raquíticas
estatísticas do governo e assusta os concorrentes. A balança comercial
(diferença entre exportação e importação) tem sido salva pela expansão da
agropecuária, constante e persistente desde que se descartou a reforma agrária
comunista.
Que relação tem a atividade agropecuária com a distinção
sibilina do meu professor? Aplique uma à outra, e veja o resultado: Nosso
primitivismo agropecuário se resolveu com o governo, sem o governo e apesar do
governo. Muito enigmático? Vamos esclarecer ponto por ponto.
Com o governo –
Não é justo atribuir todo esse progresso ao empreendedor rural. Grande parte se
deve ao profissionalismo e dedicação da Embrapa e de várias outras entidades,
cujos técnicos competentes desenvolvem pesquisas de ponta para melhorar a qualidade
e a produtividade.
Sendo a Embrapa uma entidade do governo, ao governo cabe uma
parte desse êxito, certo? Sim, desde que se entenda a qual governo isso se
aplica. Muito importante esta distinção, tendo em vista que o governo de dez
anos atrás tentou obrigar a Embrapa a sepultar pesquisas de ponta e desviar recursos
para a antiquada agricultura de subsistência. Ainda bem que não o conseguiu.
Outra
iniciativa elogiável são os empréstimos para custeio da produção. Para a
atividade rural eles são vitais, mas para o governo são um negócio bancário
cercado de todas as garantias, além de lucrativo em juros e impostos. Um favor
útil, sem dúvida, mas muito interesseiro; e que precisa, aliás, ser melhorado e
ampliado.
Sem o governo –
Mesmo sendo o grande beneficiário do lucro que recebe do agronegócio, o governo
deixa os empreendedores rurais à própria sorte: malha rodoviária deteriorada;
deficiência ou ausência de assistência médica; escolas rurais inexistentes ou
em condições precárias; falta de proteção aos proprietários rurais, que
funciona como verdadeiro incentivo a vândalos e invasores; dificuldades e
leniência na reintegração de posse. Tudo isso, e muito mais, gera grandes prejuízos
para os empreendedores e os desestimula. O perdedor é sempre o trabalhador
rural, com a redução da oferta de empregos – o único benefício que ele realmente
procura.
Apesar do governo – A ação do governo no setor rural produtivo é uma
sequência de tiros no pé, penalizando os empreendedores e premiando quem não
merece: exigências ambientalistas draconianas; legislação trabalhista só
aplicável a gabinetes luxuosos de burocratas brasilienses; indústria de multas
arbitrárias e exorbitantes; confisco de propriedades, para torná-las
improdutivas nas mãos de índios urbanos indolentes e manobrados por ONGs; expropriação
de produtores para entregar terra a aventureiros auto-rotulados de quilombolas,
mesmo contrariando a lei, que exige continuidade no uso da terra reivindicada.
Após remoção injusta de proprietários legítimos, o governo deixa assentados
nelas (ou confortavelmente deitados) os índios urbanos e falsos quilombolas.
Obstáculos
ou doenças são equivalentes, na medicina e no campo, desde que se entenda
metaforicamente alguns deles: Ervas daninhas, mau tempo, predadores, vírus, pragas,
carestia, vermes, corrupção. Nos dois casos, a solução é remover os obstáculos
ou causadores de doenças. Nos dois casos, essa faxina traz progresso e lucro. Nos
dois casos, o governo não parece interessado em soluções, muito antes pelo
contrário.
Uma
ressalva sobre certo tipo de obstáculos é que as atividades criminosas de
invasores e vândalos (MST & Cia.) não são exatamente do governo, alguns afirmam que o governo é apenas conivente. Confirmando
a ironia de um escritor: Em Brasília todos são inocentes, e todos são
coniventes.
O
governo parece não entender as coisas desta maneira. Por quê? Por estar encharcado
de ideologia esquerdista, comprovadamente ineficiente e ultrapassada. Minha frágil
esperança é que agentes do governo se envergonhem do atual desempenho – do tipo
apesar de, com seus resultados
negativos – e passem a agir de acordo com esta norma de vida criada pela
sabedoria popular, ancorada na experiência diária: Quem não atrapalha, já ajuda.
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