Incra, nova fase
Denis Lerrer Rosenfield
O
noticiário político está tão voltado para questões urgentes – como a aprovação
da PEC 241, do teto do gastos públicos, e a reforma da Previdência – que
iniciativas importantes terminam por ser relegadas a segundo plano.
Nesse caso
se encontram mudanças importantes no Plano Nacional de Reforma Agrária que
estão sendo implementadas, mostrando outra face do governo Temer. A reforma
fiscal tem, aqui, uma contraparte essencialmente social.
O
presidente tem dado orientações explícitas a esse aspecto social de sua
atuação, enfatizando todo um novo processo de aprimoramento dos instrumentos de
obtenção de terras, de titulação dos assentamentos, de novo processo de seleção
dos beneficiários e de regularização de terras cultivadas, sem a anuência do
Incra.
No dizer do presidente desse órgão estatal, Leonardo Góes, “o governo
federal busca dar maior segurança jurídica àqueles que têm terra e produzem,
além de promover o acesso à terra a quem quer produzir alimentos”.
Em
pouco tempo será publicada uma medida provisória (MP) voltada para o
equacionamento dessas questões. Ela se caracteriza por seu perfil eminentemente
técnico, avesso a problemas de ordem ideológica. Só esse ponto já seria
suficiente para definir a nova gestão do Incra.
Em
vários momentos das administrações anteriores, com a ressalva da gestão Guedes,
esse importante órgão deixou de ser propriamente um órgão de Estado para se
tornar um instrumento dos movimentos sociais. Agora a orientação técnica é
predominante com um sentido de Estado.
A
questão da titulação é, certamente, uma das mais importantes em pauta. Uma
particularidade dos assentamentos da reforma agrária, até aqui, consistia no
fato de serem tutelados pelos movimentos sociais, que ali fincaram um dos
pilares de sua militância e de recrutamento de membros para invasões.
Um
assentado é, assim, não só tutelado pelo Estado, mas, principalmente, pelo MST.
Não são produtores autônomos, mas objeto de uma política assistencialista,
voltada para a criação de uma clientela política. Também não são propriamente
agricultores familiares, por não deterem a propriedade de suas terras.
Com a
titulação abre-se a possibilidade de se tornarem verdadeiramente agricultores
familiares, com melhores condições de obtenção de crédito, de compra de
maquinário e de assistência técnica.
Um agricultor familiar entra numa relação
de mercado, tem melhores condições de trabalho e de educação para seus filhos,
vislumbrando-se um futuro melhor.
Contraste-se,
por exemplo, a condição dos agricultores familiares no sistema integrado de
produção no Sul do País, envolvendo as cadeias produtivas do tabaco (pioneira),
de aves e de suínos e se estendendo a outros setores produtivos, com a dos
assentados. Uns são prósperos, outros vivem em favelas rurais.
Muitos
assentamentos têm agricultores produtivos, que almejam tornar-se familiares,
mas se veem impedidos por não poderem adquirir terras de seus vizinhos que não
produzem e vivem da assistência estatal.
Pelos critérios atuais, ao cultivarem
as terras desses seus vizinhos, que podem tê-las cedido mediante um contrato
informal de arrendamento ou de compra e venda, eles se encontram em situação
irregular.
Aliás, ambos estão, por não serem proprietários de suas respectivas
terras. São tutelados, não têm liberdade de escolha.
Pela
nova MP, porém, poderão regularizar sua situação, aumentando a produção de
alimentos, e a terra pode ser cultivada por quem quer realmente produzir. É
urgente este novo reordenamento fundiário, corrigindo aquelas anomalias, ainda
defendidas por movimentos sociais ideologicamente obtusos.
A nova seleção
de beneficiários almeja ser técnica e transparente, deixando de ser um
instrumento do MST, que tinha a função de escolher os beneficiários, aumentando
assim a sua militância. Várias denúncias, aliás, têm aparecido envolvendo
pessoas que já são proprietárias, funcionários públicos, militantes, etc.
Incra.
Chegou a impedir novos assentamentos para que essas anomalias fossem
devidamente corrigidas. O descalabro era enorme, produzido, principalmente,
pelo viés ideológico e político-partidário que presidia o processo seletivo.
Haverá, agora, um papel mais importante das prefeituras e, sobretudo, maior
divulgação de todo esse processo.
Outro
ponto diz respeito à obtenção de terras para a regularização fundiária, por
exemplo, na Amazônia Legal, ou para os assentamentos da reforma agrária. Há a
necessidade de acelerar os trâmites administrativos, para tudo se resolver o
mais rapidamente possível.
Imagine-se
a situação de um proprietário que tem a sua terra invadida enquanto decisões
judiciais de reintegração de posse não são cumpridas. O Pará é um Estado que
vive enorme crise, numa situação que poderíamos designar como terra sem lei.
Um tal
mecanismo de obtenção de terras, a preços vigentes e com pagamento em dinheiro
– e não necessariamente mediante Títulos da Dívida Agrária –, seria um
instrumento que poderia facilitar o equacionamento de tais conflitos, além,
evidentemente, de maior respeito à lei, não seguida em vários Estados do País.
Seriam compras nas condições de uma economia de mercado.
O campo
brasileiro foi, nos governos petistas, um terreno privilegiado de conflitos,
como se tivéssemos aqui uma “luta de classes” que terminaria com a vitória
“revolucionária” dos ditos “movimentos sociais”.
O setor rural, a despeito dos
ideólogos esquerdistas, foi, porém, objeto de uma verdadeira reforma, que
tornou o Brasil um dos maiores produtores mundiais de alimentos.
A
realidade mudou completamente nas últimas décadas. Cabe, agora, uma nova
legislação e uma nova política que reflitam e deem conta desta nova situação. O
caminho abre-se à pacificação nacional.
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