domingo, 8 de julho de 2018

Espírito de (java)porco...




O Javaporco e a política

No último dia 28 de junho, sob o olhar beneplácito de uma plateia sorridente, nosso Exmo. Governador França sancionou projeto de lei do deputado Tripoli que proíbe a caça no estado de São Paulo. O objeto dessa medida foi o Javaporco, único animal com previsão de abate na natureza regulamentado pelo Ibama, desde 2013.

O semblante dos presentes era sereno, típico de pessoas de bem, especialmente quando têm a absoluta certeza da atitude tomada. O ambiente exalava civilidade em contraste ao ato violento que é o abate de animais e o deputado Tripoli, em sintonia legítima com sua crença, justificava o ritual como o fim da “barbárie com a matança de animais”. Infelizmente para todos nós, um enorme erro de avaliação.

Faço aqui uma profecia fácil. O legado desta atitude corajosa do Governador França é sombrio para a agropecuária e para o cidadão Paulista.

O Javaporco é fruto da ingenuidade e irresponsabilidade humanas. Ao mesclar o Javali europeu com seu parente, o porco, potencializamos a agressividade do Javali com o peso e tamanho das raças melhoradas de suínos domésticos. É um animal agressivo, voraz, extremamente grande e forte. Não raramente encontramos animais com mais de 280 kg.

Exótico e nocivo em nosso ambiente, sem predadores naturais o prolífico Javaporco é contumaz destruidor de nascentes, mudas de árvores, plantações de milho, cana de açúcar, amendoim e de um sem número de produtos da horticultura, além de atacar o homem.

Cresce em projeção geométrica e não há paralelos na natureza de tal poder de destruição no microambiente onde vive. Ocorre que esse ambiente é exclusivamente rural e certamente o público que criou e aprovou tal lei é urbano; não o fosse, certamente não a teriam aprovado.

O erro cometido por entediados ingleses que trouxeram o Javali da Europa para caçá-lo na monótona pampa Argentina, a partir daí cruzado com o porco e disseminado na América do Sul, é agora perpetuado por essa medida que poderá trazer consequências de altíssimo custo para os cidadãos urbanos.

Estimo perdas entre 20 e 30 % de lavouras inteiras com ataques noturnos de bandos de 50 até 100 indivíduos. Voraz, o Javaporco não come o que destrói. Em plantações os pés de milho são cortados rente ao chão e as espigas levemente roídas, muitas intocadas, são perdidas. A destruição chega a 4, 5 hectares em apenas uma noite.
 
O resultado da perda de alimentos, da qualidade nas forragens e da perda de produtividade tem como consequência direta a ineficiência no setor primário e o aumento de custos nas prateleiras dos supermercados. São milhões de reais em prejuízos aos setores produtivos.

Mas e o futuro? Quando assistimos imagens de helicópteros com atiradores portando armas de longo alcance abatendo enormes bandos de javaporcos na Austrália, aliás, um país “civilizado” no padrão que busca o Governador ao abolir a caça em SP, é porque a situação já é apavorantemente crítica. Qual a chance de não repetirmos essa história aqui no Brasil com a medida do último dia 28 de junho?

Sem controle, sem predadores naturais, com enorme capacidade de procriação, alimento farto e disponível o ano todo, como é possível que alguém vislumbre solução não catastrófica para tal situação?

Além da “barbárie”, vi o deputado Tripoli comentar que os caçadores estão “abatendo outras espécies” e “soltando javaporcos para perpetuar a caça”. Onde está o pragmatismo?

Obviamente a solução é coibir os infratores e não abandonar um problema cuja consequência é outro muitas vezes mais relevante e caro para a sociedade. Difícil entender essa lógica.

Sem dizer que a medida certamente vai levar para a ilegalidade centenas de produtores familiares e médios, gente de bem, que, apavorados e inconformados, muito provavelmente não vão entregar aos porcos seu suado patrimônio.

Outra importante consequência é a futura decretação de São Paulo como livre da febre aftosa sem vacinação. Veja o risco de submeter o rebanho bovino do estado mais rico da nação ao transito livre de ungulados que, sem qualquer medida profilática, podem carregar o vírus da aftosa?  O Estado de São Paulo deve transferir risco de tal magnitude aos pecuaristas? E em progressão geométrica?

Infelizmente a medida foi ingênua ou inconsequente. Esperamos do Governador a reversão da sanção anunciada no último dia 28 de junho.

Engº Agrônomo Roberto Hugo Jank Junior, produtor rural.Vice-presidente da Associação Leite Brasil, do Fundecitrus - Fundo de Defesa da Citricultura e da Abraleite. Membro do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp - Cosag

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