O Javaporco e a política
No último dia 28 de
junho, sob o olhar beneplácito de uma plateia sorridente, nosso Exmo.
Governador França sancionou projeto de lei do deputado Tripoli que proíbe a
caça no estado de São Paulo. O objeto dessa medida foi o Javaporco, único
animal com previsão de abate na natureza regulamentado pelo Ibama, desde 2013.
O semblante dos presentes
era sereno, típico de pessoas de bem, especialmente quando têm a absoluta
certeza da atitude tomada. O ambiente exalava civilidade em contraste ao ato
violento que é o abate de animais e o deputado Tripoli, em sintonia legítima
com sua crença, justificava o ritual como o fim da “barbárie com a matança de
animais”. Infelizmente para todos nós, um enorme erro de avaliação.
Faço aqui uma profecia
fácil. O legado desta atitude corajosa do Governador França é sombrio para a
agropecuária e para o cidadão Paulista.
O Javaporco é fruto da
ingenuidade e irresponsabilidade humanas. Ao mesclar o Javali europeu com seu
parente, o porco, potencializamos a agressividade do Javali com o peso e
tamanho das raças melhoradas de suínos domésticos. É um animal agressivo,
voraz, extremamente grande e forte. Não raramente encontramos animais com mais
de 280 kg.
Exótico e nocivo em nosso
ambiente, sem predadores naturais o prolífico Javaporco é contumaz destruidor
de nascentes, mudas de árvores, plantações de milho, cana de açúcar, amendoim e
de um sem número de produtos da horticultura, além de atacar o homem.
Cresce em projeção
geométrica e não há paralelos na natureza de tal poder de destruição no
microambiente onde vive. Ocorre que esse ambiente é exclusivamente rural e
certamente o público que criou e aprovou tal lei é urbano; não o fosse,
certamente não a teriam aprovado.
O erro cometido por
entediados ingleses que trouxeram o Javali da Europa para caçá-lo na monótona
pampa Argentina, a partir daí cruzado com o porco e disseminado na América do
Sul, é agora perpetuado por essa medida que poderá trazer consequências de
altíssimo custo para os cidadãos urbanos.
Estimo perdas entre 20
e 30 % de lavouras inteiras com ataques noturnos de bandos de 50 até 100
indivíduos. Voraz, o Javaporco não come o que destrói. Em plantações os pés de
milho são cortados rente ao chão e as espigas levemente roídas, muitas
intocadas, são perdidas. A destruição chega a 4, 5 hectares em apenas uma
noite.
O resultado da perda de
alimentos, da qualidade nas forragens e da perda de produtividade tem como
consequência direta a ineficiência no setor primário e o aumento de custos nas
prateleiras dos supermercados. São milhões de reais em prejuízos aos setores
produtivos.
Mas e o futuro? Quando
assistimos imagens de helicópteros com atiradores portando armas de longo
alcance abatendo enormes bandos de javaporcos na Austrália, aliás, um país
“civilizado” no padrão que busca o Governador ao abolir a caça em SP, é porque
a situação já é apavorantemente crítica. Qual a chance de não repetirmos essa história
aqui no Brasil com a medida do último dia 28 de junho?
Sem controle, sem
predadores naturais, com enorme capacidade de procriação, alimento farto e
disponível o ano todo, como é possível que alguém vislumbre solução não
catastrófica para tal situação?
Além da “barbárie”, vi o
deputado Tripoli comentar que os caçadores estão “abatendo outras espécies” e
“soltando javaporcos para perpetuar a caça”. Onde está o pragmatismo?
Obviamente a solução é
coibir os infratores e não abandonar um problema cuja consequência é outro
muitas vezes mais relevante e caro para a sociedade. Difícil entender essa
lógica.
Sem dizer que a medida
certamente vai levar para a ilegalidade centenas de produtores familiares e
médios, gente de bem, que, apavorados e inconformados, muito provavelmente não
vão entregar aos porcos seu suado patrimônio.
Outra importante
consequência é a futura decretação de São Paulo como livre da febre aftosa sem
vacinação. Veja o risco de submeter o rebanho bovino do estado mais rico da
nação ao transito livre de ungulados que, sem qualquer medida profilática,
podem carregar o vírus da aftosa? O
Estado de São Paulo deve transferir risco de tal magnitude aos pecuaristas? E
em progressão geométrica?
Infelizmente a medida foi
ingênua ou inconsequente. Esperamos do Governador a reversão da sanção
anunciada no último dia 28 de junho.
Engº Agrônomo Roberto
Hugo Jank Junior, produtor rural.Vice-presidente da Associação Leite Brasil, do
Fundecitrus - Fundo de Defesa da Citricultura e da Abraleite. Membro do
Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp - Cosag
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