domingo, 28 de dezembro de 2014

Os porta-bandeiras do MST, índios, trabalhadores 'escravizados e quilombolas sempre alinhados rumo à luta de classes


Anistia Internacional e o 'Charco no Maranhão'


Thaynã Menezes, formada em Relações Internacionais pela PUC-GO e membro do Grupo de Ativistas Voluntários da Anistia Internacional em Goiânia, escreveu para o "Diário da Manhã" o artigo abaixo... Os negritos e sublinhamentos são do Blog.


Façamos uma breve retrospectiva voltando ao ano de 2010, especificamente no dia 30 de outubro, quando um homem foi morto. Seu nome era Flaviano Pinto Neto, vivia numa comunidade quilombola e era reconhecido como líder da luta do seu povo.  
Luta essa, que visava à libertação do povoado das mãos de um latifundiário que se dizia dono das terras da Comunidade do Charco, e sendo assim, os obrigava a pagar taxas absurdas para usufruírem da terra onde vivem a (sic) quase 200 anos, fazendo com que não sobrasse sequer dinheiro suficiente para o sustento das famílias desse povoado localizado no interior do Estado do Maranhão na cidade de São Vicente de Ferrer.
A comunidade quilombola do Charco fica na região conhecida como “Baixada” Maranhense, a pouco menos de 300 km da capital São Luís. Lá vivem, hoje, em torno de 90 famílias. 
A paisagem seca no mês de outubro não reflete a realidade que dá nome ao local — “Charco” — uma referência ao alagamento da região durante o período das chuvas. 
A falta de chuvas e de infraestrutura para uma eventual irrigação não permitem o plantio de quase nada nesta época, mas assim mesmo, as palmeiras de babaçu enfeitam a paisagem. 
Naquela terra, quando a chuva permite, plantam mandioca, arroz, milho, batata e criam alguns animais. Também coletam coco de babaçu, porém, a maior parte da produção não ficava com eles.
Ameaças de queimadas, espancamentos e destruição da plantação eram alguns dos “argumentos” utilizados pelo suposto “dono” das terras, caso os quilombolas se recusassem a pagar as taxas. 
Os moradores do Charco sempre questionaram a legalidade dessa exigência, e se colocaram a pensar: se as famílias eram nascidas e criadas ali, como aquela terra poderia pertencer à outra pessoa? 
Flaviano era o presidente da Associação de Moradores do Charco e exigiu então que o fazendeiro apresentasse o título de propriedade que comprovasse que ele era o proprietário da região. 

Como nenhum documento foi apresentado, os moradores da comunidade quilombola do Charco pararam de pagar o “foro” exigido pelo latifundiário.
A partir de então as ameaças passaram a se transformar em atentados, os quilombolas tiveram plantações destruídas, casas queimadas e um líder morto. 
A morte de Flaviano trouxe visibilidade não só para a luta da comunidade do Charco. Esse crime se “transformou num símbolo da gravidade dos conflitos de Terra no Maranhão e mobilizou entidades Maranhenses como a Comissão Pastoral da Terra – CPT; a Federação dos Trabalhadores da Agricultura – FETAEMA; a Comissão de Direitos Humanos da OAB, a Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e Caritas” (Fonte: Jornal Pequeno).
A extensão dos prejuízos econômicos, sociais, e, sobretudo humanos, dos conflitos agrários no Maranhão, representados pela morte de Flaviano, chamou também a atenção de instituições internacionais, como a Anistia Internacional.
Anistia Internacional (A.I.) é um movimento global apartidário, sem interesses econômicos e que não possui vínculos estatais e religiosos, com mais de 3 milhões de apoiadores, localizados em 150 países, realizando ações e campanhas para que os direitos humanos internacionalmente reconhecidos sejam respeitados e protegidos. 
A organização atua desde os anos de 1960 e no Maranhão acompanha os problemas agrários desde 2010 com ênfase nos desdobramentos dos conflitos como o quilombo Pontes (em Pirapemas), a comunidade Santa Maria dos Moreiras (em Codó), e da própria comunidade do Charco, onde Flaviano foi assassinado. 
No caso do Charco a A.I. exige ao lado dos quilombolas o fim das ameaças de remoção e a titulação definitiva das terras onde o quilombo está estabelecido desde o século XIX.
O processo de identificação e titulação de comunidades quilombolas no Estado do Maranhão é bastante lento. São cerca de mil comunidades quilombolas no estado, das quais pouco mais de 400 já tiveram o certificado emitido pela Fundação Palmares. 
Mas o número de comunidades que teve o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) concluído não chega a dez. A comunidade do Charco é uma delas. E essa lentidão no processo de titulação definitiva das comunidades quilombolas deixa essas comunidades expostas a uma situação de risco de ameaças e ataques por parte de fazendeiros locais.
De acordo com Renata Neder, assessora de direitos humanos da Anistia Internacional no Brasil, em uma entrevista dada a um jornal Maranhense, diversas “Ações Urgentes” foram lançadas desde 2010 em defesa de lideranças, defensores de direitos humanos e comunidades no Maranhão. 
A “Ação Urgente” é um chamado da Anistia Internacional para que seus membros e ativistas se mobilizem e enviem cartas, e-mail ou fax para as autoridades chamando a atenção para uma situação de risco imediato e pedindo a proteção – e outras medidas cabíveis – para garantir a segurança do defensor de direitos humanos ou da comunidade em risco.
Além das “Ações Urgentes” a A.I. promove todos os anos durante a semana do Dia Internacional de Direitos Humanos, 10 de dezembro, uma ação chamada Maratona das Cartas, onde são selecionados casos que vão dar visibilidade a outros abusos similares, já que a instituição não consegue acompanhar todas as denúncias que infelizmente são muitas. 
Então os ativistas dos 150 países saem às ruas em suas defesas: explicam para a população o que é a Anistia Internacional, o que ela defende, expõem os casos e arrecadam assinaturas para que cartas sejam enviadas, e violações dos direitos humanos sejam reparadas. 
Nesta edição, a Anistia acompanha denúncias da Noruega, Venezuela, Estados Unidos, Índia e Brasil (Fonte: Site da Anistia Internacional Brasil).
Porém como sabemos que nada avança sem muita luta, a Anistia Internacional está presente para fazer a pressão necessária contra governos e instituições. 
Como disse Zilmar Mendes, sobrinha de Flaviano e atual presidente da Associação de Moradores da Comunidade do Charco, o “governo é que nem feijão, só vai na pressão”.


http://www.dm.com.br/texto/201531-a-anistia-internacional-e-a-comunidade-do-charco-no-maranhao

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