De pires na mão
Eliane Cantanhêde
O primeiro-ministro chinês, Li
Keqiang, foi recebido em Brasília como o salvador da Pátria ou, pelo menos, o
salvador da lavoura. Exageros à parte, até porque muita coisa é requentada, o
fato é que os 35 acordos e a promessa de US$ 53,3 bilhões dos chineses chegam
numa boa hora, tanto para o Brasil quanto para a presidente Dilma Rousseff.
Com a economia empacada, crises para
todo lado, a Petrobrás manchando a imagem do País lá fora e os consulados
devendo até as contas de água e luz, o pacote oferecido por Keqiang vem bem a
calhar.
Mas, atenção: ele confirma também o enorme senso de oportunidade dos
chineses. Eles aproveitam a liquidação, compram na baixa. Estão comprando um
banco, encomendando 40 aviões da Embraer (com financiamento do BNDES),
investindo em petróleo, gás, infraestrutura e assinando dois acordos de US$ 70
bilhões com a combalida Petrobrás. Até a ferrovia ligando o Brasil ao Peru
voltou à pauta e aos sonhos, para escoar matérias-primas brasileiras para a
China e para o resto da Ásia, pelo Pacífico.
Keqiang aproveitou para reconfirmar,
pela enésima vez, a liberação de carne bovina brasileira para a China. A
ministra da Agricultura, Kátia Abreu, era toda sorrisos ontem no almoço de
Dilma para o casal chinês, no Itamaraty, e não foi à toa que o cardápio foi
carne, carne e carne. Das boas.
Também o ministro de Minas e Energia,
Eduardo Braga, parecia bastante satisfeito – e antes mesmo de devorar a
primeira garfada, com mais de uma hora e meia de atraso. Entre tantos projetos
nas áreas de refino e distribuição, ele falava com especial interesse em dois:
pesquisa e produção de energia solar e eólica. “Os chineses estão investindo
pesadamente nisso. Eles pensam no futuro”, disse.
Também estavam lá o vice Michel
Temer, o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e o onipresente Joaquim Levy,
que agora negocia não só com deputados e senadores como também com invasores da
Fazenda.
E compareceram a alta cúpula militar, os presidentes do BNDES, da
Embraer e da Embrapa e representantes da iniciativa privada, enquanto
governadores faziam fila: do Maranhão, de Pernambuco, do DF...
Nesses tempos de pindaíba e de
tesouradas no Orçamento, todos estão de olho num “negócio da China” e a
República não se fez de rogada: compareceu em peso. É assim que, com tantas más
notícias na política, na economia, na gestão, na polícia, Dilma conseguiu pelo
menos uma lufada de ar fresco. Lufada que vem justamente de fora, apesar de sua
relação desleixada com a política externa.
Silencioso, já no quinto mês de
governo, o chanceler Mauro Vieira parecia feliz com a casa cheia, enquanto seus
embaixadores cochichavam pelos cantos que o banquete de Li Keqiang deve ser o
mais importante deste ano, perdendo apenas para um que será a muitos
quilômetros de Brasília: o de Dilma e Barack Obama, junho, em Washington. Mas,
dificilmente, os americanos acenarão com tantas verdinhas quanto os chineses.
Agora, a pergunta que não quer calar
e que os diplomatas também repetiam nas rodinhas de conversa: afinal, a China,
tão estratégica, parceira tão próxima dos Brics, é aliada ou adversária, soma
ou divide, ajuda ou atrapalha? Ao mesmo tempo em que investe no Brasil, a China
também tira mercado. E não apenas do Brasil...
Independentemente disso, não dá para
ficar em elucubrações e alimentar desconfianças. É a China ou a China, que já é
o maior parceiro comercial do Brasil no mundo e que, além da soma de
interesses, cumpre o papel de atrair a atenção para o País e sinalizar que a
crise é braba, mas fazer negócios por aqui ainda vale a pena.
É torcer, ou rezar,
para que o mundo acredite.
Bala perdida. O embaixador Guilherme Patriota só foi
atingido na testa porque passou pelo plenário na hora do tiroteio contra Luiz
Fachin. Para salvar Fachin, mataram Patriota.
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