domingo, 7 de abril de 2013

Decifra-me ou te devoro!


Novo Código Florestal Nacional e o Código Ambiental de Santa Catarina 

Artigo de Julis Orácio Felipe

No ano de 2.009 o Estado de Santa Catarina assombrou o Brasil com a publicação de seu código ambiental. Polêmico, fez uso da competência concorrente definida na constituição, sendo suportado pelo parágrafo primeiro do artigo vinte e quatro da Lei Maior, artigo que proíbe a União de legislar normas especializadas, limitando-se a emitir normas gerais.
Ato contínuo, o Ministério Público ingressou com ação direta de inconstitucionalidade contra o diploma, utilizando outro argumento, bastante corrente na jurisprudência brasileira e na doutrina ambiental, alegando que o código florestal nacional é norma geral por sua origem, ou seja, toda e qualquer norma emitida pela União seria sempre geral, cabendo ao código estadual catarinense apenas regrar lacunas da lei geral ou regrar especificidades locais, todavia sempre na direção do que seria mais restritivo.
Esse é o ponto controvertido, sobre o qual se sustenta não somente a definição da constitucionalidade do código barriga-verde e sim toda a estrutura que diz respeito à competência concorrente nacional.
É uma queda de braços entre centralização e pacto federativo que envolve o sistema jurídico como um todo, não apenas o sistema jurídico ambiental. Note o leitor que a competência concorrente versa sobre: direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; orçamento; comerciais; custas dos serviços forenses; produção e consumo; florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; educação, cultura, ensino e desporto; criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas; procedimentos em matéria processual; previdência social, proteção e defesa da saúde; assistência jurídica e Defensoria pública; proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência; proteção à infância e à juventude; organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis. Assim, não é difícil entender o impacto de qualquer decisão apressada sobre o tema. Apenas para constar, o código ambiental de Santa Catarina está em pleno vigor desde abril do ano de 2.009 e até o momento não houve manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada.

Mas há mais a comentar.
O código ambiental catarinense foi questionado em face da lei 4.771/65, o antigo código florestal brasileiro, hoje revogado expressamente em virtude da lei 12.651/12, conhecida como o “Novo” Código Florestal Brasileiro. É algo relevante, obviamente, vez que agora o código catarinense deve ser avaliado em conjunto com o novel texto jurídico. Analisando essa questão nós nos deparamos com situações questionadas na Ação Direta de Inconstitucionalidade em andamento contra a lei catarinense que não podem mais ser interpretadas da mesma maneira, pois o novo código florestal brasileiro nos lançou nova luz.
Uma análise atenta do código catarinense, principalmente a luz de dados concretos de uma propriedade rural, em conjunto com o novo código florestal brasileiro evidencia que, em vários aspectos outrora questionados pelo Ministério Público, o código catarinense tornou-se mais rigoroso do que o código florestal nacional em vigor, principalmente para os pequenos proprietários rurais.
E isso ocorre também nas questões relativas às áreas de preservação permanente de mata ciliar, justamente o tema mais duramente questionado nas ações ministeriais.
É um paradoxo.
Os inimigos do código ambiental de Santa Catarina podem, a partir de agora, tornarem-se seus maiores defensores!
Isso porque, no quesito mata ciliar de beira de rios, o código catarinense regula a proteção em função da largura dos rios e não em função de módulos fiscais!
Esse fato tem um significado imenso. Ele, por si só, fulmina de morte a inconstitucionalidade arguida em face de suposta diminuição de área de preservação permanente de mata ciliar pela lei catarinense, justamente porque em diversas hipóteses reais (basta o leitor efetuar simulações com dados concretos de propriedades) essa diminuição de proteção não ocorre! Ora, se em concreto não há essa diminuição, ela não pode ser arguida em abstrato.
É um fenômeno interessante, que no meu entender impede a inconstitucionalidade desses artigos da norma estadual, podendo a mesma ser arguida apenas pela via indireta em casos concretos ajuizados e que leva a necessidade de um licenciamento ambiental propriedade a propriedade, por uma questão de lógica: Não há como dizer se há ou não ilegalidade a menos que sejam medidas as larguras dos rios em todo o seu caminhamento dentro de uma propriedade rural para saber qual norma aplicar...
Mas há mais!
Os que combatem o instituto área consolidada incorrem em erro de avaliação. Não se trata mais de área consolidada e sim de um novo regime jurídico de uso de solo que surgiu a partir da revogação do código anterior, e esse novo regime jurídico permite a ocupação de área de preservação permanente, apenas que no caso de áreas de preservação permanente de mata ciliar de beira de rios essa ocupação é condicionada a restauração de uma parte da área. A insistência em aniquilar o instituto área consolidada rural criada no sistema jurídico a partir da publicação da nova lei leva ao raciocínio de sempre: O que fazer com as áreas historicamente já ocupadas? Obviamente devem ser demolidas já que não haveria direito adquirido...
Se não houver essa demolição, essa realocação de atividades e benfeitorias, inclusive em área urbana, haverá uma afronta escabrosa frente ao princípio da isonomia, tão escabrosa quanto à tentativa de aviltar o princípio da tripartição dos poderes criada pela novel teoria da proibição do retrocesso socioambiental que pretende revogar o direito de ser revogada uma lei.
Painel Florestal, 05/04/2013

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