... OS MÉDIOS AGRICULTORES
Evaristo
Eduardo de Miranda[1]
Os
médios produtores rurais estão ameaçados de extinção pelo novo Código
Florestal, a Lei no. 12.651 de 25 de maio de 2012. Ela reduziu a capacidade de
produção desses agricultores a tal ponto que os tornou menores do que os
pequenos agricultores em boa parte do Brasil, com as mesmas exigências da
legislação ambiental previstas para os grandes produtores.
Mantida a situação
ocorrerá uma antirreforma agrária, com a absorção progressiva de centenas de
milhares de médios agricultores pelos grandes ou pela falência, com impactos
sociais e econômicos negativos na produção de leite, carne, etanol, algodão,
grãos e oleaginosas. A MP 571/2012 será um tiro de misericórdia ou de salvação
para os médios produtores rurais? O interesse do Brasil está em jogo.
Como encontrar essa espécie rara, o
médio produtor? Pelo
Módulo Fiscal (MF). Essa unidade de medida, expressa em hectares, é fixada pelo
INCRA para cada município do país.
Ele serve de parâmetro para a classificação fundiária do imóvel rural
quanto a sua dimensão.
De acordo com art. 4º da Lei nº 8.629/93, são
consideradas médias propriedades, os imóveis rurais de área compreendida entre
4 e 15 MFs. Abaixo estão as pequenas e acima as grandes propriedades. Essa
divisão é a base de políticas públicas em assentamentos, crédito agrícola,
seguro rural etc.
Quantos espécimes de médios produtores
rurais existem na natureza? Segundo o Censo Agropecuário do IBGE de
2006, eles eram aproximadamente 307.000 imóveis ou 6% do total dos
estabelecimentos agrícolas; representavam 17% da área ocupada pela agropecuária
nacional e produziam anualmente cerca de 21 bilhões de reais ou 14% do valor da
produção agrícola do Brasil. Além disso, mantinham preservados em seus imóveis
mais de 6 milhões de hectares de florestas (Figura 1)
Quem são os médios produtores? Boa parte deles
integra lavoura e pecuária. São grandes produtores de leite, carne, algodão,
café, hortaliças, cana-de-açúcar (fornecedores), cereais e oleaginosas,
principalmente nas regiões Sul, Centro Oeste e Sudeste. Ao contrário de parte
dos pequenos agricultores em que o autoconsumo absorve parte significativa da
produção, os médios são competitivos, estão integrados ao mercado e abastecem
as cidades e diversas cadeias de exportação.
A
perda de habitat ou por que os médios ficaram pequenos? O novo Código
Florestal, na prática, isentou os pequenos agricultores da exigência da Reserva
Legal. Em seu artigo 67
ele determina que nos imóveis rurais com “área de até 4 (quatro) módulos
fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais
inferiores ao previsto no art. 12, a Reserva Legal será constituída com a área
ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas
conversões para uso alternativo do solo.”
Além disso, seus cultivos perenes de
fruteiras, por exemplo, podem ser computados como parte da reserva legal. Como
a exigência da reserva legal é plena para os médios produtores, eles podem
ficar com menos área para uso agrícola do que os pequenos. Um médio produtor
que tenha 4,5 ou 5 módulos fiscais, ao ter que manter de 20 a 80% de sua
propriedade em reserva legal, conforme o bioma, fica com uma área disponível
bem menor do que um pequeno agricultor.
O que restará da
média propriedade rural? Bem pouco. Virtualmente, no Acre, Rondônia, Pará, Amapá, Roraima, na parte
amazônica do Mato Grosso, Tocantins e Maranhão, a área disponível para 57.000
médios produtores rurais, com 5 MFs, utilizarem é da ordem de um quarto do
disponível para os pequenos agricultores! Nos outros estados do Brasil, sua
área também ficou menor ou igual à dos pequenos agricultores, e pode
inviabilizar suas atividades em muitos casos.
Mas de 184.000 médios produtores,
que dispõe de até 10 MFs e representam cerca de 4% dos estabelecimentos
agrícolas e mais de 9% da área da agropecuária nacional também serão vitimados.
Eles ficaram virtualmente com áreas menores que os pequenos agricultores em
toda a Amazônia e também em parte do Brasil, dependendo do seu tamanho e do
bioma.
A Medida
Provisória 571: golpe final ou salvação? A MP 571, ao dar nova redação ao artigo 61 da Lei no. 12.651,
quebrou vários paradigmas pela exigência retroativa
de recomposição de faixas marginais não mais em função da largura dos rios, mas
do tamanho da propriedade.
Acertou ao diferenciar a situação dos pequenos
agricultores. Mas esqueceu-se das exigências de Reserva Legal que pairam
plenamente sobre os médios produtores. As exigências adicionais de recomposição
retroativa de APPs fulminarão os
médios que agora, em boa parte, já ficaram menores ou iguais aos pequenos.
Por
questão de justiça é fundamental aperfeiçoar a MP 571 para que, como nos
pequenos, aos médios sejam exigidas: as mesmas faixas de composição; o mesmo gatilho
de 20% da área do imóvel e a possibilidade de recompor com espécies lenhosas,
ou de ciclo longo exóticas, passíveis de exploração econômica (Figuras 1 e 2).
Ao contrário do
que tem sido propalado, a MP 571 não alcança, nem beneficia mais de 90% dos agricultores.
Segundo o IBGE, os pequenos representam 86% dos estabelecimentos agrícolas. Se
os congressistas contemplarem na MP 571 a dramática situação dos médios
produtores aí sim se poderá chegar a 87% (5MFs), a 91% (10 MFs) e até mesmo a
92% (15MFs) dos produtores rurais (Figura 1). Todos anões um dia foram pequenos, diz um ditado. No Brasil rural,
eles ficaram minúsculos e podem desaparecer.
FIG. 1 - ESTIMATIVA POR TAMANHOS DE
ESTABELECIMENTOS POR NÚMERO DE MÓDULOS FISCAIS (IBGE 2006)
Extratos (MF_Médio_Brasil
= 26 ha)
|
Total de
estabelec.
|
% de
estab.
|
% acum.
|
Área
total (ha)
|
% da área
total da agropecuária
|
% acum.
|
Área
total de APP/RL existente em 2006
(ha) |
% de área
APP/RL existente em relação à área agropec. total
|
Valor
total da produção anual (1000 R$)
|
% do
valor da prod.
|
% acum.
|
Maior de 0 a menos de 26 ha
(até 1 MF)
|
3.382.645
|
65,36%
|
65,36%
|
23.312.416
|
7,07%
|
7,07%
|
1.323.570
|
5,68%
|
40.271.760
|
28,00%
|
28,00%
|
De 26 (1 MF) a
52 ha (2 MFs)
|
690.764
|
13,35%
|
78,71%
|
21.955.813
|
6,65%
|
13,72%
|
1.868.966
|
8,51%
|
18.045.191
|
12,55%
|
40,55%
|
De 52 (2 MFs) a menos de 104 ha (4 MFs)
|
384.049
|
7,42%
|
86,13%
|
26.597.178
|
8,06%
|
21,78%
|
2.976.793
|
11,19%
|
12.930.721
|
8,99%
|
49,54%
|
De 104 ha (4
MFs) a 130 ha (5 MFs)
|
57.266
|
1,11%
|
87,23%
|
7.629.112
|
2,31%
|
24,09%
|
892.131
|
11,69%
|
3.082.842
|
2,14%
|
51,68%
|
De 130 ha (5
MFs) a 260 ha (10 MFs)
|
184.350
|
3,56%
|
90,79%
|
29.819.028
|
9,04%
|
33,13%
|
3.510.529
|
11,77%
|
11.237.441
|
7,81%
|
59,50%
|
De 260 ha (10
MFs) a 390 ha (15 MFs)
|
65.372
|
1,26%
|
92,06%
|
20.104.741
|
6,09%
|
39,22%
|
2.402.052
|
11,95%
|
6.364.542
|
4,43%
|
63,92%
|
Mais de 390 ha (15 MFs)
|
411.042
|
7,94%
|
100,00%
|
200.523.106
|
60,78%
|
100,00%
|
37.189.060
|
18,55%
|
51.888.812
|
36,08%
|
100,00%
|
Total
|
5.175.489
|
100%
|
-
|
329.941.393
|
100%
|
-
|
50.163.102
|
15,20%
|
143.821.309
|
100%
|
-
|
Extratos
(MF_Médio_Brasil = 26 ha)3
|
Total de
estabelec.
|
% de
estab.
|
Área
total (ha)
|
% da
área total da agropecuária
|
% da
área total do território
|
Área
total de APP/RL existente em 2006
(ha) |
% de
área APP/RL existente em relação à área agropec. total
|
Valor
total da produção anual (1000 R$)
|
% do
valor da prod.
|
Pequenos (< 4 MFs)
|
4.457.458
|
86,13%
|
71.865.407
|
21,78%
|
8,44%
|
6.169.329
|
8,58%
|
71.247.672
|
49,54%
|
Médios (>4 e < 15 MFs)
|
306.989
|
5,93%
|
57.552.880
|
17,44%
|
6,76%
|
6.804.712
|
11,82%
|
20.684.825
|
14,38%
|
Grandes (> 15 MFs)
|
411.042
|
7,94%
|
200.523.106
|
60,78%
|
23,55%
|
37.189.060
|
18,55%
|
51.888.812
|
36,08%
|
Total
|
5.175.489
|
100%
|
329.941.393
|
100%
|
38,75%
|
50.163.102
|
15,20%
|
143.821.309
|
100%
|
Extratos
(MF_Médio_Brasil = 26 ha)3
|
Total de
estabelec.
|
% de
estab.
|
Área
total (ha)
|
% da
área total da agropecuária
|
% da
área total do território
|
Área
total de APP/RL existente em 2006
(ha) |
% de
área APP/RL existente em relação à área agropec. total
|
Valor
total da produção anual (1000 R$)
|
% do
valor da prod.
|
Pequenos (< 4 MFs)
|
4.457.458
|
86,13%
|
71.865.407
|
21,78%
|
8,44%
|
6.169.329
|
8,58%
|
71.247.672
|
49,54%
|
Médios (>4 e < 15 MFs)
|
306.989
|
5,93%
|
57.552.880
|
17,44%
|
6,76%
|
6.804.712
|
11,82%
|
20.684.825
|
14,38%
|
Grandes (> 15 MFs)
|
411.042
|
7,94%
|
200.523.106
|
60,78%
|
23,55%
|
37.189.060
|
18,55%
|
51.888.812
|
36,08%
|
Total
|
5.175.489
|
100%
|
329.941.393
|
100%
|
38,75%
|
50.163.102
|
15,20%
|
143.821.309
|
100%
|
gia, pesquisador da Embrapa.
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