Um ano após protestos, satisfação de brasileiros cai igual à de países
da
Primavera Árabe
Pesquisa de
instituto americano mostra que problemas na economia e frustração com políticos
derrubam humor da população em níveis comparáveis ao do Egito e de nações que
passaram por crises institucionais
WASHINGTON - A
percepção do brasileiro em relação à situação do País, à conjuntura econômica e
ao governo Dilma Rousseff se deteriorou de maneira acentuada em apenas um ano,
desde que milhares de pessoas tomaram as ruas do País para protestar contra a
corrupção e a má-qualidade dos serviços públicos, como revela levantamento
inédito do Pew Research Center, um dos principais institutos de pesquisa dos
EUA.
A radical mudança
de humor em um espaço tão curto de tempo é rara, disse ao Estado Juliana
Horowitz, brasileira responsável pelo trabalho. Segundo ela, o Pew Research
realizou levantamentos em 82 países desde 2010 e só viu oscilações tão acentuadas
em lugares que passaram por crises ou rupturas institucionais, como o Egito.
"O nível de
frustração expressado pelos brasileiros em relação à direção de seu país, sua
economia e seus líderes não tem paralelo em anos recentes", diz o texto de
apresentação da pesquisa.
Horowitz ficou
surpresa com a magnitude da transformação na opinião pública e atribuiu essa
mudança principalmente à piora da situação econômica e ao aumento da inflação.
A insatisfação com a realização da Copa do Mundo no Brasil também contribuiu:
61% dos entrevistados responderam que o evento é ruim para o País, por tirar
recursos que poderiam ser usados em serviços públicos.
Na comparação com o
ano passado, a mudança mais acentuada de humor ocorreu na percepção da situação
econômica. O porcentual dos entrevistados que a classifica de "ruim"
subiu de 41% para 67%, enquanto o índice dos que a consideram boa caiu de 59%
para 32%. A inflação foi apontada como o principal problema brasileiro por 85%
dos entrevistados, pouco acima da criminalidade e da assistência médica, ambos
com 83% das menções.
Apesar de o
desemprego estar em patamares historicamente baixos, 72% disseram que a falta
de oportunidades de trabalho é o maior problema do Brasil, o que colocou essa
questão em quinto lugar entre 14 itens.
Até o ano passado,
havia um descolamento entre a avaliação da economia e da situação do País como
um todo. Apesar de 55% declararem que estavam insatisfeitos "com as
coisas" no Brasil, 59% diziam que a situação econômica era boa. Na nova
pesquisa, as duas linhas convergiram, observou Juliana Horowitz. O porcentual
de insatisfeitos subiu para 72%, enquanto o dos que reprovam a economia saltou
para 67%. "Em parte isso reflete o fato de que o País não está
crescendo", afirmou.
Depois de ter
expansão de 2,3% em 2013 - abaixo da média dos países emergentes -, o PIB
brasileiro aumentou apenas 0,2% no primeiro trimestre de 2014, na comparação
com os três meses anteriores. A inflação fechou 2013 em 5,91% e há o risco de
que, em 2014, ela supere o teto de 6,5% definido pelo Banco Central.
Segundo o
levantamento, a frustração com a situação econômica azedou a avaliação da
gestão Dilma, cuja atuação no enfrentamento de problemas-chave é desaprovada
por maioria expressiva dos entrevistados. Para 86%, o governo é inepto no
combate à corrupção, e 85% desaprovam sua performance em relação à
criminalidade e à assistência médica. A administração da economia é reprovada
por 63% dos entrevistados.
A influência de
Dilma sobre o Brasil é avaliada como negativa por 52% dos consultados e como
positiva por 48%, o que mostra uma população divida. Os números indicam que no
último ano de seu mandato, em 2010, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
tinha avaliação muito melhor: 84% diziam que sua influência no Brasil é positiva
e apenas 14% a classificaram de negativa.
Mas Dilma conseguiu
resultados mais positivos que os de seus principais adversários na disputa
eleitoral, Aécio Neves e Eduardo Campos. Em um placar quase de empate, uma
ligeira maioria (51%) disse ter opinião favorável da presidente, enquanto 49%
optaram pelo desfavorável. No caso do tucano, a visão desfavorável alcançou 53%
e a favorável, 27%. A opinião em relação a Campos, do PSB, é desfavorável entre
47% dos entrevistados e favorável para 24%.
Ainda há uma
parcela do eleitorado sem opinião formada sobre os dois candidatos de oposição,
o que poderá aumentar ou diminuir sua popularidade no futuro, ponderou Juliana
Horowitz. Vinte por cento dos entrevistados não se manifestaram sobre Aécio. Em
relação a Campos, o porcentual foi de 27%.
O Pew Research
elaborou os questionários da pesquisa e o trabalho de campo no Brasil foi feito
pela empresa Market Analysis, de São Paulo. Foram ouvidos 1.003 adultos
representativos da população do País. Esse é o quarto levantamento anual que o
Pew Research realiza no Brasil. O instituto é um dos mais importantes do mundo
e fez pesquisas em 82 países desde 2010.
CLÁUDIA TREVISAN - CORRESPONDENTE DE O ESTADO DE S. PAULO
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