Reforma da Reforma
Agrária
Destaque: A medida
provisória vai no caminho certo, ao tirar a reforma agrária da órbita de
grupelhos e partidos que usam o problema da terra como arma eleitoral. Mas isso
não basta. É preciso ter coragem de assumir o fracasso da reforma
agrária. O que falta é dar reais condições – jurídicas, técnicas e
econômicas – para que os já assentados participem dos avanços do agronegócio,
superem a pobreza e possam colaborar ativamente para o crescimento do País.
Segue editorial de O
Estado de São Paulo - 31 Dezembro 2016.
Reforma agrária sem 'agentes'
O Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) condenou a medida provisória (MP) por meio
da qual o governo de Michel Temer mudará a política de reforma agrária e de
regularização fundiária. Só isso basta para concluir que se trata de uma boa
iniciativa.
Na sexta-feira
passada, o governo publicou a Medida Provisória 759/2016, que trata da
regulamentação fundiária rural e urbana. Em linhas gerais, no que diz respeito
à questão rural, o texto se presta a desburocratizar o processo de
regularização das terras em assentamentos e também a facilitar as
desapropriações para realizar a reforma agrária.
Segundo o governo,
a meta é entregar até o final de 2018 cerca de 280 mil títulos de domínio para
assentados, além de acelerar a venda de terras da União para os beneficiários
do Programa Nacional de Reforma Agrária. A prioridade, segundo informou o
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), será dada aos
9.332 assentamentos já existentes, nos quais está cerca de 1 milhão de
famílias.
Nas contas
oficiais, esses 280 mil títulos representam 12 vezes mais do que o total
emitido nos 13 anos de governo dos petistas Lula da Silva e Dilma Rousseff, que
fizeram da reforma agrária uma de suas principais bandeiras políticas e
eleitorais. Além disso, segundo o Incra, a MP garante aos proprietários de
terras desapropriadas rapidez no ressarcimento, o que pode reduzir as
costumeiras disputas judiciais nessa área.
Os assentados só
terão direito ao título definitivo de posse se pagarem pela terra. O pagamento
poderá ser feito em até dez anos, com desconto de 20% para áreas maiores e de
60% para áreas menores. Se mais tarde o titular quiser vender a terra, terá de
esperar dez anos para realizar o negócio.
A MP procura também
resolver uma distorção que havia levado o Tribunal de Contas da União (TCU) a
suspender o processo de titulação de lotes. O TCU entendeu como irregular a
distribuição de terras para funcionários públicos. Agora, os servidores estão
expressamente proibidos de receber os títulos. No entanto, a medida permite que
o beneficiário preste concurso público depois de ganhar a titulação.
Mas o aspecto mais
significativo da MP, que ajuda a dissipar os ares ideológicos da reforma
agrária, são os novos critérios de seleção dos beneficiários do programa,
exatamente o ponto que mais irritou o MST. A partir de agora, cabe apenas aos
municípios – com base em “parâmetros mais objetivos”, como enfatizou o Incra –
organizar a distribuição de terras, dispensando a intermediação dos movimentos
de sem-terra. O assentado não precisa mais estar acampado para se candidatar a
um lote, ou seja, não tem de estar mais vinculado ao MST e congêneres, situação
que havia transformado esses grupos sem personalidade jurídica em agentes
oficiais da reforma agrária.
A única tarefa dos
movimentos como o MST, como se sabe, era servir de apoio ao governo petista,
usando os assentados como massa de manobra. Foi assim que o MST transformou a
reforma agrária em próspero negócio imobiliário, garantindo o financiamento de
invasões e dos protestos violentos Brasil afora. A medida provisória assinada
por Temer acaba com essa boquinha, razão pela qual o MST protestou, dizendo que
o objetivo do governo é prejudicar o movimento e “jogar o poder da seleção” dos
beneficiários “para o coronel local”, além de “facilitar a venda (de terras)
para os grandes proprietários nacionais e estrangeiros”.
A medida provisória
vai no caminho certo, ao tirar a reforma agrária da órbita de grupelhos e
partidos que usam o problema da terra como arma eleitoral. Mas isso não basta.
É preciso ter coragem de assumir que, hoje, não há mais por que falar em
ampliação da reforma agrária, uma vez que há cada vez menos gente interessada
em trabalhar no campo. O que falta é dar reais condições – jurídicas, técnicas
e econômicas – para que os já assentados participem dos avanços do agronegócio,
superem a pobreza e possam colaborar ativamente para o crescimento do País.
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