O que houve com Álvaro Dias?,
perguntam-se os milhões de paranaenses que votaram em outubro passado num
candente opositor do governo lulopetista e acabaram reconduzindo ao Congresso
um aliado incondicional de Luiz Edson Fachin? Como entender que um porta-voz do
Brasil decente no Legislativo se tenha transformado em cabo eleitoral do doutor
escolhido por Dilma para tornar majoritária no Supremo a bancada dos ministros
da defesa de culpados?
Decidido a instalar Fachin no
gabinete prematuramente esvaziado por Joaquim Barbosa, o senador do PSDB
assumiu sem explicões razoáveis (e sem ficar ruborizado) o papel de estafeta de
um caçador de togas. Uma guinada e tanto para esse paulista de Quatá criado em
Maringá que, desde a ascensão do lulopetismo ao poder, tem sido um dos
raríssimos integrantes da oposição partidária em permanente sintonia com o país
que presta.
Antes de escancarar-se a estranha
parceria com Fachin, a bela voz de locutor de rádio, sempre afinada com a voz
rouca das ruas, ensinou em centenas de pronunciamentos corajosos como falar com
fluência a linguagem dos indignados. Aos 70 anos, Álvaro Dias mudou de rumo e
de lado. O tribuno veemente deu lugar ao homem que murmura pedidos de votos
para uma ameaça ambulante ao Estado Democrático de Direito.
Alguma coisa parece ter-lhe
confiscado o instinto de sobrevivência. Em rota de colisão com centenas de
milhares de manifestantes exaustos de corrupção e incompetência, Álvaro Dias se
nega a compreender que o apoio a Fachin é uma forma especialmente desonrosa de
suicídio eleitoral. É um pecado sem remissão. Como descobriram tarde demais os
senadores Demóstenes Torres e Kátia Abreu, não existe uma segunda chance para
quem acampa voluntariamente na catacumba dos que capitularam por tão pouco. Ou
quase nada.
O surto de suicídios políticos assumirá dimensões endêmicas se a bancada
oposicionista não enxergar a tempo a relevância da sabatina a que Fachin será
submetido na Comissão de Constituição e Justiça — e, sobretudo, a importância
histórica da votação no plenário que decidirá em última instância se o eleito
por Dilma merece um lugar no Supremo. Não merece, saberá o Brasil se os
senadores cobrarem respostas que dissipem pelo menos quatro zonas de sombra
localizadas por VEJA na edição desta
semana.
1) Por anos a fio, Fachin foi
simultaneamente procurador-geral do estado e advogado militante. A esse acúmulo
de funções, proibido pela Constituição paranaense e, portanto, ilegal, soma-se
uma agravante só contornada por gente dotada do dom da ubiquidade: o duplo
emprego não impediu que Fachin continuasse a dar aulas na universidade. A
sabatina precisa esclarecer esse milagre da multiplicação do tempo.
2) Em numerosos artigos, entrevistas
e discursos, Fachin deixou claro seu menosprezo pelo preceito constitucional
que garante a propriedade privada no Brasil. Se é que mudou de ideia, por que
nunca se desmentiu?
3) Fachin sempre foi ostensivamente
simpático ao MST, uma velharia comunista que não tem existência jurídica. Os
laços afetivos permanecem? Como estão no momento as ligações promíscuas entre
quem deveria defender o cumprimento das normas legais e o bando comandado pelo
fora da lei João Pedro Stédile?
4) Fachin sempre defendeu a
desapropriação de terras produtivas para fins de reforma agrária, sem o
pagamento de indenização aos proprietários lesados. Recuperou o juízo ou ainda
é tripulante da nau dos insensatos?
Há mais, muito mais. Mas o que acima
se leu informa que a presença de um Fachin no STF pode ser ainda mais ruinosa
que a de um Dias Toffoli. Como ocorre agora, também os defensores do
ex-advogado do PT, ex-assessor de José Dirceu na Casa Civil e chefe da
Advocacia-Geral da União garantiram que quatro ou cinco sessões do Supremo
bastariam para que o novo ministro proclamasse a própria independência. Erraram
feio, sabe-se hoje.
O Brasil de 2015 é outro. As
multidões nas ruas avisam que não são poucos os providos do sentimento da
vergonha. Contam-se aos milhões os que mantêm sob estreita vigilância os
senadores eleitos para fazerem oposição. Quem trocar a oposição pelo amém ao
governo não escapará do castigo reservado aos desertores.
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