Ácaros predadores salvam sua salada
Ninguém quer consumir folhas de alface danificadas por bichinhos.
Muito menos comprar tomatesrecheados de acaricidas sistêmicos, um tipo de veneno
que penetra pelo caule da planta para matar pragas sugadoras, como o ácaro rajado (Tetranychus urticae). E o agricultor
também não quer perder a produção para um microexército, capaz de provocar
quebras de até 80% nas culturas de morango em suas
infestações, embora cada bichinho tenha apenas um mísero milímetro.
Felizmente existem meios de mobilizar
outro microexército para combater o das pragas, eliminando a necessidade de
recorrer aos venenos químicos: já temos biofábricas que
produzem ácaros predadores para acabar
com os ácaros sugadores, nas áreas plantadas com hortaliças (e também de plantas ornamentais).
Funciona assim: os ácaros predadores
(Neoseiulus californicus e Phytoseiulus macropilis) são embalados com
vermiculita, um mineral de origem basáltica, usado para manter os bichinhos
secos.
Assim que a embalagem é aberta e o conteúdo é distribuído sobre as
plantas infestadas, os ácaros predadores identificam o ácaro rajado pelo cheiro
e atacam, alimentando-se deles.
Como os ácaros predadores já são adultos, eles
também se multiplicam e continuam dando combate à praga. Cada fêmea desse
bichinho pode dar origem a 50 novos “combatentes” em um mês. E quando a praga
acaba, os predadores vão embora, atrás de novas presas. Semresíduos químicos e sem dano para a salada que chegará à mesa.
A biofábrica Promip, localizada na região de Piracicaba, no interior de São Paulo, foi
inicialmente incubada naEsalqTec, a incubadora da
Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (Esalq-USP).
Em dois anos (de 2006 a 2008),
a empresa ganhou escala e agora já produz 200 milhões de ácaros predadores por
ano, de três espécies: as duas já mencionadas, usadas contra o ácaro rajado, e
outra que combate uma mosquinha.
E esses são só alguns dos bioprodutos. Segundo um dos sócios, Marcelo Poletti, a empresa investe constantemente no
desenvolvimento de novos meios de viabilizar o manejo integrado de pragas em escala
comercial. Isso inclui desde a pesquisa com pragas e seus inimigos naturais até
o desenvolvimento de embalagens para garantir que os bioprodutos cheguem ao
campo em condições de uso.
Em alguns casos, o investimento é feito com recursos
da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), sobretudo pelo programa de Pesquisa
Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE).
“As pragas são
favorecidas pelo emprego de pesticidas e também pelos desequilíbrios causados
pelo uso de fertilizantes nitrogenados”, lembra Poletti. “Com os ácaros
predadores restabelecemos o equilíbrio sem necessidade de químicos”.
As duas espécies
usadas contra o ácaro rajado foram originalmente coletadas pelo pessoal da
Promip nas próprias culturas infestadas. Ambas são espécies cosmopolitas, de
ampla distribuição em todo o mundo – incluindo o Brasil – e com ocorrências até
em ilhas bem isoladas, como Cook e Fiji, a leste da Austrália, e a nossa
Fernando de Noronha.
Alguns dos exemplares coletados foram depositados para
fins de registro e os demais, multiplicados em casas de vegetação, para dar
origem aos bioprodutos.
É mais um benefício de se recorrer
à biodiversidade na solução
natural – não poluente nem contaminante – de problemas cotidianos!
Fotos:
Promip (ácaro predador Phytoseiulus macropilis, ao alto, e
aplicação do bioproduto em plantas infestadas, acima)
Jornalista
ambiental há mais de 30 anos, escreve sobre clima, ecossistemas, fauna e flora,
recursos naturais e sustentabilidade para os principais jornais e revistas do
país. Já recebeu diversos prêmios, entre eles, o Embrapa de Reportagem 2015 e o
Reportagem sobre a Mata Atlântica 2013, ambos por matérias publicadas na
National Geographic Brasil.
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