Onde está o Congresso para restaurar a Lei
e o direito de propriedade?
Supremo julga
constitucional decreto de demarcação de terras quilombolas
O Supremo Tribunal Federal julgou, na tarde desta
quinta-feira (8/2), que é constitucional o decreto presidencial que regulamenta
a demarcação de terras quilombolas, incluindo a autodeclaração das comunidades.
Foram 10 votos pela improcedência total ou parcial da ação e um a favor, o do
relator, ministro hoje aposentado Cezar Peluso.
A ação foi movida pelo Democratas (DEM) — à época,
PFL — contra o ato assinado em 2003 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
O partido apontou questionamentos em relação à autodeclaração dos
quilombolas sobre terras de valor cultural e ao fato de a regulamentação
do procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e
titulação das terras ocupadas por remanescentes dos quilombos ter sido feita
por decreto presidencial — e não por projeto de lei com tramitação no
Congresso Nacional.
Em 2017, ao apresentar seu voto, o ministro Dias
Toffoli abriu divergência, pedindo um marco temporal para a constitucionalidade
do decreto, afirmando ser necessário delimitar a Constituição de 1988 como
recorte, ou seja, que as comunidades estivessem instaladas nas áreas que
reivindicam em 1988.
O decreto também valeria para os grupos que comprovassem
terem perdido a terra para terceiros.
O ministro Gilmar Mendes o acompanhou.
Foi então que o ministro Edson Fachin pediu vista.
"Ao
racismo já existente na sociedade, associou-se um quadro de abandono que levou
a maioria dos negros à marginalização social", disse Fachin.
Nelson Jr./SCO/STF
Nesta quinta, Fachin apresentou seu voto-vista, no
qual fez uma remontagem histórica, afirmando que “a ideia da existência de
quilombos remonta ao período da tragédia da escravidão no Brasil”, que
sobreviveu "ao longo dos séculos e incorporou-se ao patrimônio cultural
brasileiro".
“Ao racismo já existente na sociedade, associou-se um quadro
de abandono que levou a maioria dos negros à marginalização social, condição
que envergonha, até os dias de hoje, uma sociedade que se pretende plural, mas
que ainda tem muito passos no caminho da igualdade social e da promoção das
diferenças”, continuou o ministro.
O ministro argumentou ser direito de todos os
brasileiros a tutela do patrimônio quilombola, como forma de conhecimento da
história e proteção das manifestações culturais que compõem não apenas a
identidade do povo quilombola, mas também a identidade brasileira.
O ministro Ricardo Lewandowski acompanhou Fachin e
divergiu da solução apresentada por Toffoli. O ministro disse que seria
"quase impossível" provar que a terra foi apropriada de maneira
ilegal depois de 1988.
"O que me ocorreu é que essa prova é
diabólica: difícil ou impossível de ser conseguida. Como vai se fazer uma
prova de fatos que ocorreram há quase meio século atrás? Não se pode exigir que
um grupo assuma o ônus da prova", afirmou.
Toffoli se manifestou argumentando que estava
havendo uma interpretação equivocada do seu voto. Segundo o ministro, a
compreensão do marco de 1988 é quase preventiva, para evitar que depois uma
comunidade exija que precisa de mais terras.
"Dou interpretação para
evitar que haja continuidade do conflito. É para evitar conflitos futuros, não
é para rechaçar o passado", defendeu.
Votaram pela improcedência integral da ação a presidente
da corte, Cármen Lúcia, e os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Ricardo
Lewandowski, Luiz Fux, Rosa Weber e Fachin.
O ministro Luís Roberto
Barroso também votou pela improcedência, mas com a diferença que, além das
comunidades remanescentes presentes às terras na data da publicação da
Constituição Federal de 1988, a seu ver, teriam direito à terra
aquelas que tiverem sido forçadamente desapossadas, vítimas de esbulho.
Tramitação
A ação direta de inconstitucionalidade começou a ser julgada em 2012, quando o
ministro relator, Cezar Peluso, hoje aposentado, deu procedência à ação para
julgar o decreto inconstitucional, por conta de seus vícios formais.
“É farta a
doutrina e a jurisprudência do STF no sentido de que a Administração Pública
não pode, sem lei, criar ou restringir direitos”, afirmou na época.
A ministra
Rosa Weber pediu vista do julgamento, tendo como preocupação, avaliar melhor “a
questão de fundo, ou seja, a questão de inconstitucionalidade formal e
material” envolvendo o tema.
Em 2015, a ministra Rosa Weber,
apresentou seu voto-vista pela improcedência da ação, por entender que a norma
está de acordo com a Constituição Federal. Houve, então, pedido de vista do
ministro Dias Toffoli, que apresentou seu voto em novembro do ano passado,
abrindo uma terceira tese.
Toffoli votou pelo reconhecimento parcial da
inconstitucionalidade na ação ajuizada pelo Democratas contra o Decreto
4.887/2003, no que foi acompanhado por Gilmar Mendes. Foi então que houve
o pedido de vista de Fachin, que levou o processo a Plenário nesta
quinta-feira.
O ministro Alexandre de Moraes não votou no caso
por ocupar a cadeira que era de Peluso, posteriormente passada a Teori
Zavascki, que morreu em acidente em janeiro de 2017.
ADI 3.239
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