Corrupção da Petrobras põe o Brasil à beira do precipício
Bandeira do Brasil em plataforma da
Petrobras. / FELIPE DANA (AP)
O sistema é simples, diabólico e
eficaz: um acusado de corrupção reduz sua pena se delatar outros, que por sua
vez podem receber o mesmo tratamento, com o que o caso se ramifica ao infinito.
É a maneira que o juiz brasileiro Sérgio Moro tem para reconstruir o rastro da
bilionária corrupção que domina de cima a baixo a
maior empresa pública da América Latina, a Petrobras, e que sacode o
país: contratos forjados no valor de bilhões de reais, obras superfaturadas
para a construção de refinarias, contas bancárias repentinamente esvaziadas
para que não sejam congeladas, arrependidos que fazem acordos após pagar quase
100 milhões de reais, maletas com notas de dinheiro que vêm e vão, jatinhos
levando somas estonteantes, um tesoureiro do PT envolvido na trama e
intermediários que se entregam após passar dias foragidos da polícia.
E, além disso, vários dos maiores empresários do país, todos detidos na
mesma carceragem sob a acusação de suborno, dividindo espaço e
destino com o delator, Alberto Youssef, que tudo sabe e tudo conta…
O sonoro nome que a Polícia Federal
deu à última fase da operação, Juízo Final, é sintomático. Tudo no Brasil gira
atualmente em torno dessa gigantesca empresa pública e das venenosas revelações
que surgem a cada manhã.
Há no momento 16 detidos. Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da
Petrobras, e dois diretores de uma empresa fornecedora, que aderiram
ao programa de delação premiada, estão sob prisão domiciliar. Os outros 13
(empresários, diretores de empresas, altos executivos, outro ex-diretor da
Petrobras e o quarto delator, o doleiro Alberto Youssef) convivem na carceragem
da sede da Polícia Federal em Curitiba.
Youssef, claro, está numa cela à
parte, pois seu advogado não se fia totalmente na preservação da sua
integridade física, já que Youssef se tornou o alvo a abater.
Todos
os envolvidos são acusados de alimentar um esquema ultraconhecido: os altos
funcionários da Petrobras recebiam subornos das empresas em troca da concessão
de contratos. Figuras marginais andavam para lá e para cá com malas que
azeitavam uma máquina que chegou a movimentar mais de 10 bilhões de reais.
Ninguém conhece a soma real. As
empresas implicadas tinham (e têm) contratos no valor de 60 bilhões de reais.
Mas quanto disso ficava pelo caminho? Seriam 10%? Ou 20%? Ou 50%? O ex-diretor
Costa e o doleiro Yousseff dizem que os partidos políticos, entre os quais o PT
de Lula e Dilma Rousseff, levavam sua parte, que chegava a 3%.
A Petrobras, com seus 86.000
funcionários, não é uma empresa qualquer: refina 98% da gasolina consumida no
Brasil, mantêm negócios com quase 20.000 empresas que lhe fornecem todos os
tipos de produtos e serviços, e é ela própria responsável por um décimo de
todos os investimentos feitos no Brasil.
Por isso o Governo, nocauteado pela
crise, teme não só a repercussão política do caso (há acusações ainda não
confirmadas de financiamento ilegal de partidos, entre os quais PT e PSDB), mas
também uma eventual ressaca econômica e também social.
Das dez maiores empresas de
engenharia e construção do país, só duas não estão envolvidas no escândalo da
Petrobras. Por isso há quem enxergue um risco concreto de que as principais obras públicas em
andamento sejam paralisadas. Ou seja, que o país pare.
Foi o que disse na quinta-feira José
Costa Neto, presidente da principal empresa elétrica brasileira, a Eletrobras,
controlada pelo Governo. Nesse mesmo dia, o governador da Paraíba, Ricardo
Coutinho, acrescentou após uma reunião com a recém-reeleita Rousseff:
“A presidenta está preocupada com o que
vai acontecer com as obras. E eu, como Governador, também. Imagine o que
significaria agora paralisar, por exemplo, a construção dos canais do São
Francisco”.
Um dos advogados dos presos declarou
nesta semana, após visitar seu cliente, que o suborno era inevitável. “Se não,
a obra não saía. Se alguém ignorar isso, ignora a história deste país”.
Dias atrás, o empresário Ricardo
Semler, de 55 anos, escreveu um artigo na Folha de S. Paulo intitulado
“Nunca se roubou tão pouco”. “Não sendo petista, e sim tucano, sinto-me à
vontade para constatar que essa onda de prisões de executivos é um passo
histórico para este país”, escreveu Semler. “Nossa empresa deixou de vender
equipamentos para a Petrobras nos anos setenta. Era impossível vender
diretamente sem propina. Tentamos de novo nos anos oitenta, noventa, e até
recentemente. Em 40 anos de persistentes tentativas, nada feito.”
Outro advogado dos presos, ao ser
perguntado sobre as consequências do caso, respondeu: “Não sei aonde isso vai
dar”. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acrescentou numa recente
entrevista à Folha de S. Paulo que “isso é um rastilho
pólvora. Quando um começa a falar o outro diz: vai sobrar só para mim? E aí
eles começam a falar mesmo”.
As ramificações políticas são imprevisíveis: Costa
e Yousseff acusam diretamente o tesoureiro do PT, João Vaccari, de receber
subornos para ajudar as campanhas políticas do seu partido. Também apontam
outros intermediários de outros partidos.
Enquanto isso, Rousseff, em Brasília, tenta driblar
o temporal como consegue, sem aparecer muito, agarrando-se à tese que já
defendeu durante a campanha, que consiste em assegurar que sob o seu mandato a
corrupção é investigada e perseguida.
A favor dela está o fato incontestável de
empresários até recentemente intocáveis estarem na prisão. Janot disse de forma
clara na entrevista à Folha: “A Justiça de três, quatro anos para
cá não é mais uma Justiça dos três Ps: puta, preto e pobre.
Ela está indo em cima de agente político e de
corruptor”. O ex-presidente Lula, enquanto isso,
recomendou à presidenta, segundo O Globo, que espere mais tempo
para anunciar integralmente a sua nova e fornida equipe ministerial,
assegurando que nenhum dos indicados estará envolvido no escândalo.
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