quinta-feira, 16 de julho de 2015

A crise de cada um


A crise de cada um

A reação dos políticos e partidos envolvidos mostra que eles não têm noção do que se passa no país

Perguntei aos ouvintes da CBN: como a crise afeta sua vida, seus negócios? Como tem reagido? Que boa notícia espera, considerando que a presidente Dilma quer que seus assessores saiam pelo país com uma agenda positiva?

Eis algumas respostas. Delas sai uma visão de conjunto.

Pegando pesado:

“Aposentado no serviço público, voltei a pegar bico em topografia e desenho de arquitetura de imóveis para regularizar Habite-se. Meu filho já quase não dorme. É médico, fica dobrando plantão". Guilherme, Juiz de Fora

“Trabalho com manutenção e assistência técnica de celular . Isso está em alta. Mas à noite trabalho de inspetor num colégio estadual e, nas horas vagas da madrugada e finais de semana, trabalho de taxista". John Lennon, João Pessoa, Paraíba

“Ressuscitei uma velha máquina de fazer laços e enfeites. Sou técnico em eletroeletrônica e professor de matemática. Conserto tudo e estou oferecendo aulas particulares". Nilson Gabriel, S.Paulo

Viração:
“Entrei para o mercado publicitário. Estou produzindo e vendendo ímãs de geladeira para pequenas empresas e produtos para festas. Comprei máquina de corte e impressora". Nelson França, Itaboraí-RJ

“Trabalho com fotografia e para não perder clientes procurei facilitar o pagamento em mais parcelas ou dar um desconto para pagamento à vista. No dia a dia, minha família e eu temos procurado poupar energia e água para reduzir os gastos. Até para ir ao cinema pensamos duas vezes. A boa notícia que queria ouvir é que o número de ministérios seria diminuído e os senadores não ganhariam aposentadoria a cada gestão". Bruna Verrati, S. Paulo

Cortando gastos, preservando escola das crianças:
“(Precavido), estou com quatro empregos desde 2011. Vendi o carro e uso transporte público. Não janto mais fora de casa. No supermercado, cortei todos os supérfluos. Apenas não cortei os gastos com a educação de minhas filhas. E investigo a vida dos políticos antes do voto". William, engenheiro, S. Paulo

As mulheres no ajuste doméstico:
“Me sinto um Levy de saias. Cortamos o excesso de luzes acesas, velas são lindas e funcionais, jamais comemos fora nem mesmo o usual expresso da esquina, roupas usadas estão ótimas. Cortar futilidades, investir em educação". Maria Rocha

Mau exemplo:
“Cortamos uma série de gastos (até tevê por assinatura). Mas ver a quantidade de ministério, de impostos pagos sem retorno e a corrupção... desanima qualquer um". Adelaide Soares, S.Paulo

Quando o governo ajuda:
“Trabalho com manutenção e vendas de extintores de combate a incêndio. Para arrecadar mais, o governo (passou a exigir) atestado do corpo de bombeiros, que cobra das empresas. Assim, as empresas precisam ter extintores carregados ou novos". José Severino, Pernambuco

Quando o governo atrapalha:
“Trabalho em empresa pública. Gostaria de ouvir um ministro dando a notícia que os cargos comissionados, que servem ao loteamento dos partidos, seriam extintos. Isso diminuiria muito a despesa da empresa que eu trabalho e de muitas outras". Ricardo, Brasília

Desânimo:
“Sou sócia de uma distribuidora de bebidas. No começo do ano tinha dois motoristas e dois ajudantes, mas tive que demiti-los. Hoje tenho uma funcionária no escritório e uma nos serviços gerais. Mas vou encerrar as atividades em outubro. Estou desencantada". Elizabeth Carvalho, Manaus

Pegando no pé:
“Aos trancos e barrancos, tenho um loja de livros usados há 20 anos. Eu e meu filho estamos economizando até no pão. Não posso conversar com meu filho porque ele diz que sou culpada por ter votado no PT". Dulcinéia, Belo Horizonte

No batente:
“Tenho uma pequena oficina de metal mecânica. Driblar a crise tem sido um desafio. Mas passamos a vender no varejo on line, inclusive pequenas ferramentas. Desenvolvendo novos produtos, continuo na luta. E como se diz na CBN, segunda-feira, todo mundo trabalhando." Donisete Silva.

Resumo geral: as pessoas sentem a crise na sua vida e nos seus negócios. E tentam reagir na base do esforço pessoal, sem depender do governo. Melhor dizendo, apesar do governo.

Diante da pergunta — que boa notícia espera de Brasília? — foi incontável o número de respostas simples: que caiam fora, todos.

É geral a irritação com os maus exemplos. Ouvintes e leitores sentem-se ofendidos com os três carros de luxo apreendidos na casa de Collor. Acham o fim da picada os reajustes que vereadores se concedem e as vantagens que se atribuem. Citam os 39 ministérios como um grande absurdo. E ninguém acredita que o governo não tem onde cortar gastos.

Lava-jato tem apoio universal.

A reação dos políticos e partidos envolvidos mostra que eles não têm noção do que se passa no país. Nem sentem a crise, nem veem como o pessoal se mata para superá-la.


Carlos Alberto Sardenberg é jornalista

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