Enganaram Tsipras
Carlos Alberto Sardenberg
Não é piada porque o povo grego
não está achando graça nenhuma. Mas é uma ironia pronta. Há dois anos e meio,
Alexis Tsipras, então um jovem aspirante a líder europeu, esteve no Brasil para
ouvir o conselho de Dilma e Lula.
Ouviu que políticas de austeridade só levam
ao desastre e que era preciso, ao contrário, aumentar o gasto público e o
consumo. E não é que ele, eleito primeiro-ministro, seguiu o conselho quando o
governo Dilma estava fazendo justo o contrário, uma severa política de aumento
de impostos, corte de gastos e alta de juros? A mesma que os credores europeus
estão exigindo da Grécia.
Tsipras está muito ocupado com a
confusão que armou. Mas ainda assim poderia tomar um tempinho para telefonar ao
mentor e à mentora brasileira: e o que eu faço agora, hein?
Seria só para manifestar sua
bronca porque Lula e Dilma não teriam o que responder. Depois de três anos de
política anti-austeridade, a economia brasileira chegou ao desastre. Logo, o
conselho de dezembro de 2012, quando Tsipras teve longos papos com Dilma e
Lula, está superado pelos fatos.
Austeridade, então? Dá para
imaginar Tsipras reclamando com razão: mas só agora vocês me avisam? Seria
melhor, então, que os conselheiros não dissessem nada. Simplesmente não
atenderiam o telefone, celulares... e, talvez, poderiam mandar uma mensagem
tipo “desculpaí, foi mal". Sabem como é, o primeiro-ministro grego é bem
jovem, nem usa gravata.
Mesmo porque, seguem as ironias,
Dilma não poderia recomendar austeridade no momento em que sua popularidade é
um desastre tão grande quanto a economia.
E querem mais uma? Pois a Grécia,
do ano passado para cá, estava em processo de recuperação do crescimento, junto
com a Europa. Podem checar os diversos cenários que vinham sendo feitos por
instituições internacionais. Ou pela revista “Economist”: a previsão de
crescimento para este ano é (era) de 1,4%, depois de uma expansão de 0,8% em
2014.
É pouco, claro, nem de longe
repõe as perdas da recessão e o desemprego continua na casa dos 25%. Mas era um
desempenho melhor que a anti-austeridade brasileira. Nada de crescimento em
2014 e uma recessão em 2015. Alguns dirão: a recessão deste ano é culpa da
austeridade.
Não é. Nenhuma política conseguiria produzir maldades tão
rapidamente. Desastres econômicos são cuidadosamente construídos ao longo de
muitos equívocos. E tanto maior o tempo de recuperação quanto maior e mais
longo o desastre.
Tudo considerado, a população
brasileira sabe que ainda passará por tempos difíceis: inflação elevada, juros
altos, desemprego em alta e só a renda em queda. A população grega vai passar
por tempos piores, ficando ou não na Zona do Euro, fazendo ou não um novo
acordo com os credores. A incerteza trazida pelo governo de esquerda de Tsipras
levará tempo para se dissipar.
Por exemplo: se o governo reabrir
os bancos e permitir a livre movimentação do dinheiro, não sobrará um centavo
na Grécia. Toda pessoa de bom senso transferirá sua poupança para, digamos, a
Alemanha.
Mas o país estará certamente pior
se deixar o Euro, sem novo acordo de financiamento. Além dos problemas atuais,
haverá desvalorização e alta inflação na nova moeda (contra inflação zero do
euro) e, pois, a perda do valor de poupanças e rendas.
Neste caso, entrará em operação o
Plano B, explicado em entrevista a O GLOBO por Theodoros Paraskevopoulos,
assessor econômico do Syriza, o partido de Tsipras: “Suspender completamente o
pagamento da nossa dívida, em outras palavras, dar o calote. Pela primeira vez,
os bancos alemães e franceses vão sofrer com essa crise. Eu sei que, nesse
caso, a Grécia não teria mais acesso ao mercado de capitais".
Não é verdade que aqueles bancos
vão sofrer pela primeira vez. Lá atrás, no primeiro acordo de resgate da
Grécia, já foram obrigados a aceitar um desconto nos seus créditos e a
refinanciá-los com juros menores.
Hoje, é bem pequena a exposição de bancos
privados alemães e franceses à dívida grega. Aprenderam. Esta dívida está hoje,
na maior parte, com os governos e instituições europeias. A Grécia de Tsipras,
portanto, vai dar um calote nos colegas, vai passar a conta para contribuintes
de outros países.
De todo modo, ficará isolada da
Europa na política, estará fora dos mercados de capitais, sem financiamento,
portanto, e afastada da economia global. Tudo bem, disse Paraskevopoulos:
“Temos a chance de procurar novas alianças, com o Brasil, com a Venezuela, com
a Rússia".
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