AOS
SOCIALISTAS DE TODOS OS PARTIDOS
Ronaldo Ausone Lupinacci*
Em seu “Manual de Economia Política
Atual”, Carlos Galves ensina que nossa inteligência repousa quando conhece a
causa dos fenômenos, pois a luta dramática de todas as ciências consiste na
enunciação cada vez mais perfeita das leis que regem os fenômenos que
investigam (p. 41).
A observação de Galves nos interessa
sobremaneira nestes momentos tormentosos de mais uma tempestade econômica que
se abateu sobre o Brasil. A angústia e a ansiedade são agravadas pela confusão,
pois inúmeras realidades adversas vêm sendo postas em foco sem que tivesse
surgido a coerente visão de conjunto apta a sinalizar diretriz definitivamente
saneadora.
Pululam notícias sobre os mais diversos
temas ligados à economia (inflação, desemprego, queda do PIB, ajuste fiscal,
instabilidade cambial, desindustrialização, recessão, rombo na previdência
social, etc.) sem que transpareça a união dos elos da corrente perversa de
fatores de decadência, os quais interagem destrutivamente.
Para não estender a exposição além dos
limites próprios desta coluna passo a alinhar, sumariamente, os fatores nocivos
mais importantes, destacados em subtítulos, mesmo sabendo que a esquematização
de temas desta natureza oferece dificuldades de entendimento.
HIPERTROFIA
DO ESTADO
O gigantismo da estrutura estatal
acarreta uma primeira consequência: a tributação (lato senso) espoliativa. A
carga tributária (impostos, taxas e contribuições) – uma das mais elevadas do
mundo – excede de muito aquilo que seria razoável para o exercício das funções
essenciais do Poder Público (relações exteriores, segurança externa e interna,
administração da justiça e atuação subsidiária).
À toda evidência o peso dos tributos
reduz o ganho de empresas e indivíduos. A captura dos rendimentos dos
particulares traz como consectário o aniquilamento da capacidade de poupança. A
pulverização da poupança, por sua vez leva à incapacidade para investimentos.
Se a formação de capital constitui
requisito indispensável para a manutenção e para a ampliação das riquezas
tem-se que a ausência de capitais conduz à insolvência. Sem investimentos,
ademais fica estrangulado o mercado de trabalho.
Acresça-se que o gigantismo, somado à má
gestão, tende a absorver toda a receita fiscal, e, ainda assim a exigir mais
recursos, que o Estado obtém via empréstimos inchando a dívida pública, ou
emitindo moeda com o que promove a inflação.
Colateralmente, o ingresso do Estado na
captação de recursos no mercado de capitais, acentua a escassez de dinheiro que
o crédito (não distorcido) deve transformar em investimentos produtivos,
implicando adicionalmente na elevação da taxa de juros.
Este processo resulta na sufocação da
economia, pelo estrangulamento de seus elementos motores, isto é dos
particulares (empresas e indivíduos). Neste contexto assistimos às vergonhosas
incursões da presidente Dilma Roussef e do ministro Joaquim Levy ao
estrangeiro, em busca dos capitais que o Estado desintegrou por aqui.
A origem do gigantismo estatal decorre
da falsa concepção surgida no século passado segundo a qual o Poder Público
representativo das massas seria inerrante e proporcionaria a felicidade
completa a todos, do berço ao túmulo, com os instrumentos da ciência e da
técnica.
Esta concepção inerente, em graus
variáveis, às diversas formas de socialismo penetrou nas mentalidades, nas leis
e nas instituições, e veio se expandindo por força da anemia moral, da
irreflexão e da demagogia de ideólogos e políticos.
IGUALITARISMO
A tendência para promover a igualdade a
pretexto de combater as desigualdades, inclusive (ou principalmente) as
legítimas, comparece no cenário como fator coadjuvante do fracasso econômico.
Primeiro porque exacerba a ganância fiscal, apresentada como necessária para
tirar dos ricos (na verdade da classe média) e dar aos pobres através de
medidas distributivas.
Ora, mesmo exercendo suas funções
legítimas e normais (sem artificialismos tecnocráticos) o Estado atua
necessariamente na difusão de riquezas. O igualitarismo, além do mais, vem
sendo o combustível das investidas contra o direito de propriedade, o que se
infere da reforma agrária, da reforma urbana e da hipertrofia de direitos de
minorias raciais (indígenas e quilombolas).
Afora a transformação de propriedades
produtivas em guetos de miséria e estagnação as expropriações funcionam como
elementos inibidores de investimentos num país que só não soçobrou
economicamente graças ao agronegócio. À insegurança se alia a petrificação da
mão de obra não qualificada presente em tais guetos, que poderia engrossar o
contingente de mão de obra qualificada, apto a gerar maior prosperidade não só
para os infelizes confinados condenados à mera subsistência, mas para toda a
sociedade.
Em pormenorizado estudo sobre a economia
Adolpho Lindenberg menciona a lição antiga de São João Crisóstomo (século IV)
em seus “Pensamentos Escolhidos”, segundo o qual “a desigualdade é a mãe do
trabalho e da produção” (“O Mercado Livre numa Sociedade Cristã”). Portanto, a
raiz do mal não está nas desigualdades e sim nas consciências corrompidas.
DIRIGISMO
PLANIFICADOR
Corresponde a outro erro de concepção,
segundo a qual o Estado deve ser o gestor da economia através dos onipotentes
tecnocratas. O contrário ensina a doutrina social católica expressa, por
exemplo, em alocução do Papa Pio XII, segundo o qual a economia se insere nas
atividades dos particulares, e, só muito excepcional e episodicamente, nas
atribuições estatais.
O dirigismo intervencionista (nos
preços, nos salários, no câmbio, nos contratos em geral, etc.), se de um lado
causa distorções, de outro coarcta a livre iniciativa, asfixiando a liberdade
de empreender com uma infinidade de regulamentos impostos pela burocracia
despótica dos entes públicos.
AMBIENTALISMO
PSICÓTICO
Se a penetração do socialismo no Brasil
remonta à revolução de 1930, o ambientalismo é bem mais recente, pois foi
eleito como substitutivo da luta de classes para fomentar a discórdia e atuar
como aríete para o ataque ao capitalismo.
RIGIDEZ DA
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA
Um país de dimensões continentais com as
mais variadas possibilidades de atividades produtivas não pode ficar atado por
legislação trabalhista uniformizadora, inflexível. A proliferação de “direitos”
– que na outra face da moeda significam pesado ônus para os empregadores –
determina a esterilidade na manutenção e criação de postos de trabalho. É
melhor um emprego com menores vantagens do que o desemprego.
DECOMPOSIÇÃO
DA ORDEM JURÍDICA
A confiança é pressuposto insubstituível
de todas as relações sadias entre os seres humanos. Os fatores de dissolução
antes alinhados concorrem para a erosão da confiança nos empreendimentos
econômicos. Entretanto, a meu ver, o ponto mais melindroso para o requisito da
confiança se situa no ambiente jurídico, compreendidas tanto a legislação como
a aplicação do direito.
Nossa legislação é profusa, caótica,
contraditória, formando um emaranhado inextricável, de difícil compreensão não
só pelos leigos, mas até para os doutos. As incertezas que daí derivam confluem
para retrair as iniciativas diante dos riscos de interpretações divergentes e
disparatadas.
A impotência do Poder Judiciário (o
único que não sofre de hipertrofia, mas sim de anemia aguda), tanto quanto sua
crescente politização na solução dos conflitos de interesse cria ambiente de
insegurança e descrença. Este assunto foi objeto de estudos científicos que
estabeleceram a correção direta entre o ambiente jurídico seguro (existente no
Estado de Direito) e a prosperidade de uma Nação.
Ninguém quer investir onde nem se sabe
quais são os direitos e deveres, nem tampouco se está protegido na hipótese de
violação. A primeira condição da prosperidade pública reside na fruição da
ordem jurídica (Victor Cathrein, “Philosophia Moralis”) Dinheiro e poder
de manipulação à disposição do Estado favorecem a corrupção.
Em tempos de neodirigismo proposto por
figuras de destaque (Thomas Piketty, Anthony Atkinson, François Bourguignon)
adotei propositalmente para título deste artigo politicamente incorreto a
dedicatória lançada por Friedrich A. Hayek em sua clássica obra descritiva do
fracasso do socialismo intitulada “O Caminho da Servidão”, um dos trabalhos que
lhe garantiram o Premio Nobel de Economia.
Se o Brasil está hoje encalacrado tal
ruína se deve à penetração gradual, sutil, lenta, mas profunda do socialismo
nos espíritos, na legislação e nas instituições. Igualitarismo metafísico,
intervencionismo, dirigismo, cerceamento da liberdade, perseguição ao direito
de propriedade são ingredientes da receita perfeita para a mediocridade quando
não para a miséria.
Nossos meios políticos, intelectuais,
acadêmicos e religiosos, habitados por socialistas dos mais variados matizes
nos impuseram modelo deformado e deformador. Enquanto suas ideias perniciosas
ditarem os rumos do país não sairemos do atoleiro. As medidas emergenciais e
paliativas agora tomadas quando muito proporcionarão tênue e passageiro alívio.
Quando irão os socialistas de todos os
partidos abjurar de suas convicções? Não bastaram os desastres verificados em
tantas partes do mundo para afastá-los do sectarismo? Conforme advertiu
Hayek, a economia se vinga daqueles que a manipulam.
* O autor é advogado e pecuarista.
(em http://jornalnovafronteira.com.br/canais/opiniao/aos-socialistas-de-todos-os-partidos/)
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