quinta-feira, 28 de julho de 2016

Afinidades desconcertantes... mas coerentes


Afinidades desconcertantes... mas coerentes

Gregorio V. Lopes

A consonância entre esquerda e banditismo não revela nexos apenas em nossos dias; se analisarmos as revoluções ao longo da História, sempre encontraremos o mito da igualdade como fundamento para essa consonância. Um jovem meditativo.

O jovem com o qual entabulei uma dessas conversas ocasionais, na sala de espera do dentista, era bastante intuitivo. De tal modo que suas palavras logo beliscavam nervos sensíveis da trama da vida, sem usar frases feitas nem se atrelar às costumeiras injunções da mídia.

Entretanto, a falta de experiência própria da idade não lhe permitia avaliar bem a importância das coisas que percebia. Não atinava dar uma explicação para aquilo que ele mesmo via; não uma explicação qualquer de algibeira, mas uma resposta de larga visão, que raspe o fundo do problema, para além da mera política — a metapolítica, na expressão cara ao Prof. Plinio Corrêa de Oliveira.

Talvez por isso, depois de um algum tempo de conversa, ele disparou de modo direto e sem maiores lapidações a pergunta que o tornava inquieto:

— Por que existe tanta afinidade entre a esquerda e os bandidos e terroristas?

Tomado de surpresa, titubeei um pouco, e ele aproveitou minha hesitação para completar:

— Essas levas de migrantes na Europa estão cheias de terroristas e, entretanto, todos os Prelados e governos de esquerda ou assemelhados os acolhem sôfregos, mesmo contra o sentir das populações;  os sovietes de Lenine, quando tomaram o poder na Rússia em 1917, faziam sua movimentação de rua utilizando bandidos e predadores dos bens alheios; a Revolução Francesa de 1789 arrebanhava gente da pior espécie para seus motins tumultuários contra a Religião e contra o Rei; as FARC, o MST, as ONGs de esquerda, os traficantes, todos se beneficiam de altas proteções oficiais ... tudo parece fazer parte da mesma panela.

 Só então, provocado por aquela questão borbulhante, pude precisar algo que estava confuso em minha mente. Tentei explicá-lo ao meu jovem interlocutor, talvez interesse também ao leitor.

O princípio capital que está na origem das esquerdas de todos os matizes é a igualdade. Foi em nome dela que Lutero se insurgiu contra a supremacia que Jesus Cristo concedera ao Papa na Igreja; que Danton, Marat e Robespierre se levantaram contra a instituição da Realeza e a Igreja Católica, não hesitando para isso em utilizar a guilhotina como arma de guerra; que os socialistas utópicos construíram suas quimeras; que Lenine e seus bolcheviques declararam guerra à burguesia.

É em nome da igualdade, ainda hoje, que a esquerda açula o quanto pode o povo simples e cordato contra os que conservam alguma preeminência social, política ou econômica. A própria misericórdia vem sendo aproveitada como cobertura para a ideia de que é preciso acabar com a diferença entre nacionais e imigrantes, entre países ricos e países pobres.

A ideia fundamental dessa pregação, dizia eu ao meu interlocutor, é que toda desigualdade é uma injustiça, porque necessariamente os que se sobressaem, em qualquer campo, sempre o fazem à custa dos outros.

A desigualdade é uma culpa coletiva, uma espécie de pecado original da sociedade, que só pode ser redimido pela implantação da igualdade total, seja por meio de leis, de pressão ou à custa de sangue. Quem sobressai em relação aos outros, independentemente de suas intenções, é um pecador público, sempre culpado, que deve ser derrubado de sua posição e apedrejado.

Mas, veja bem meu caro, dizia eu, não se trata apenas de combater as desigualdades aberrantes e antinaturais, como as de imperadores e potentados pagãos que se consideravam deuses, ou, hoje em dia, de artistas e futebolistas que viram nababos da noite para o dia.

Mesmo as hierarquias santas e as desigualdades harmônicas e proporcionais, tão defendidas pela doutrina da Igreja Católica e tão benéficas para a sociedade, essas mesmas devem ser repudiadas, pelo simples fato de serem desigualdades.

As críticas que a esquerda costuma fazer ao capitalismo não se devem a este ou àquele defeito que o regime apresenta nesta ou naquela nação em concreto. Falhas ou abusos reais existem e até podem ser utilizados como pretexto para a increpação. Mas a verdadeira razão é que o capitalismo, ao manter a instituição natural da propriedade privada, conduz à desigualdade.

Por isso é preciso um socialismo que impeça absolutamente os mais capazes, ou mais esforçados, ou mais favorecidos pelas circunstâncias de alcançar um nível de vida melhor que o dos outros.

Nessa concepção, a luta de classes prospera: há os capitalistas de um lado, e de outro os marginalizados (postos à margem dos lucros e dos bens), entre estes os pobres, mas também os bandidos.

Daí o fato de que, há já algum tempo, a esquerda pôs em circulação a palavra “marginal” para designar o bandido. Ou seja, o criminoso não seria culpado pelo seu crime, não teria responsabilidade moral, mas a culpa recairia sobre a sociedade capitalista por tê-lo marginalizado. Posto em situação de inferioridade, ele naturalmente se revolta, pois a condição normal seria a igualdade total.

Mais recentemente foi cunhada também a expressão “excluídos”, tão cara à CNBB, com o mesmo significado: aqueles que foram excluídos da mesa do capital.

É claro que há diferentes graus e modalidades de esquerda. Não cabe aqui elaborar um tratado sobre o assunto. Mas, na medida em que alguém é autenticamente de esquerda (e não um simples oportunista ou enganado), levado por seu igualitarismo, sente afinidade profunda, ainda que subconsciente, com todas as categorias de “marginalizados”, mesmo os bandidos ou terroristas, citados pelo meu jovem interlocutor.

Enquanto o grosso da população está preocupada em defender-se dos bandidos, e não em facilitar sua tarefa, a esquerda deseja a proibição da compra e venda de armas e munições para os homens honestos. Essa própria distinção entre honestos e bandidos desagrada profundamente a quem se entregou ao igualitarismo esquerdista.

 A fisionomia inteligente e atenta do meu interlocutor estimulava minha loquacidade. À medida que eu lhe falava, recordei-me da seguinte descrição que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira fez das disposições malsãs de um esquerdista típico em face dos criminosos:

"Quem você chama de criminoso é uma vítima. Sabe quem é o criminoso verdadeiro? É o proprietário. Sobretudo o grande proprietário. Principalmente este é que rouba o pobre. Seu crime social é de uma maldade sem nome! [...] Um governo consciente de suas obrigações tem por dever desmantelar a repressão e deixar avançar a criminalidade. Pois esta não é senão a revolução social em marcha. Todo assassino, todo ladrão, todo estuprador não é senão um arauto do furor popular (“Quatro dedos sujos e feios”, in Folha de S. Paulo, 16/11/1983).

Outra fonte de desigualdades, talvez a mais importante, é a família. Por isso a esquerda quer destruí-la, começando por equipará-la a toda e qualquer forma de união espúria.


O dentista me chamou. Desta vez o manuseio bucal foi rápido. Ao sair, notei o meu jovem interlocutor profundamente pensativo. Não quis interromper sua meditação e ele nem me viu quando passei pela sala.


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