É pau, é pedra, é o começo do caminho
24 de abril de 2012 | 3h 07
Rodrigo Lara Mesquita, jornalista - O Estado de
S.Paulo
Chegou a
hora do voto ou do veto para o novo Código Florestal e todos serão perdedores
nessa história.
Por mais
de duas décadas o Código Florestal sofreu milhares de alterações por iniciativa
do Poder Executivo, sem a participação direta do Legislativo nem consulta à
sociedade.
Decretos e
medidas provisórias criaram novas figuras e exigências jurídicas, como as da
Reserva Legal e das Áreas de Preservação Permanente.
Elas
passaram a ser exigidas nas propriedades rurais de forma retroativa pelos
órgãos ambientais e, por fim, "transformaram-se em lei, sem nunca terem
sido votadas".
Isso
colocou na ilegalidade a imensa maioria dos agricultores, trouxe grande
insegurança ao meio rural e propiciou abusos e injustiças, principalmente para
os pequenos proprietários.
Os
pequenos agricultores, com até quatro módulos fiscais, representam cerca de 4,6
milhões de imóveis, ou seja, 88,8% do total existente.
Eles
ocupam 11% do território nacional e o valor estimado de sua produção, pelo
Censo do IBGE de 2006, era de cerca de R$ 72,5 bilhões, 50% do valor total da
produção agrícola do País.
O projeto
de Código Florestal revisado pelo Senado Federal vai atingi-los em cheio.
O artigo 62 exige, de forma retroativa,
que os pequenos proprietários recomponham ou abandonem parte das áreas
ocupadas, muitas vezes há mais de século, ao longo de açudes, barragens,
riachos e rios.
A
porcentagem exigida em Área de Preservação Permanente pode chegar a até 20% das
propriedades no Sudeste, no Sul, no Nordeste e em parte do Centro-Oeste. Nos
Cerrados essa área pode alcançar 35% e na Amazônia, até 80% das propriedades.
Considerados
esses "limites" de recomposição de Áreas de Preservação Permanente,
propostos pelo Senado, a perda de área produtiva dos pequenos será de cerca de
12 milhões de hectares.
Com isso,
algumas fontes estimam uma queda na renda anual dos pequenos proprietários de
quase R$ 7 bilhões. Retirar pomares e culturas e abandonar pastagens em 20%
dessas terras férteis representa perdas de mais de 50% na renda dos pequenos e
em alguns casos o seu provável desaparecimento, segundo estimativas de fontes
especializadas.
Se o
Legislativo não equacionar a questão (...) das áreas ocupadas há dezenas ou
centenas de anos, em conformidade com a legislação de seu tempo, isso exigirá
da presidente mais uma medida provisória para corrigir e evitar esse desastre
social e econômico.
Mais uma
vez, o Executivo invadirá o campo do Legislativo. Um mal menor e paradoxal para
uma nova lei que gostaria de ver encerrado esse tipo de intervenção.
Desde o
relatório inicial elaborado pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), esse projeto
foi discutido em todo o País, em mais de uma centena de audiências públicas.
Para
muitos ambientalistas, isso foi feito de forma manipulada. Por outro lado, as
organizações rurais (...) foram incapazes de organizar o debate, levar adiante
suas propostas e comunicar-se com a sociedade.
Boa parte
das propostas da Frente Parlamentar da Agricultura não está contemplada no
projeto que vai a votação esta semana.
O projeto
final do relator Paulo Piau concorda e mantém em mais de 98% a versão do
Senado. Ele parece atender mais às cobranças do Palácio do Planalto e da
ministra do Meio Ambiente do que dos próprios correligionários.
O
Ministério da Agricultura, ao contrário do ocorrido nas gestões anteriores,
esteve absolutamente ausente do debate, como se o destino da agropecuária
nacional lhe fosse indiferente.
A questão
tecnológica, do uso sustentável das terras, esteve ausente no debate do Código
Florestal. Ela não existe no texto proposto, assim como o tema da irrigação.
É enorme a
responsabilidade da direção da Embrapa nessa omissão.
Em vez de premiar quem
usa práticas sustentáveis e intensivas, o Código Florestal considera que a
nossa agricultura está na fase em que os cafezais destruíram as encostas do
Vale do Paraíba ou no Neolítico.
E como tal
é considerada uma ameaça ao meio ambiente. O novo código não incentivará um uso
mais adequado das terras, por meio de tecnologias mais produtivas e
sustentáveis.
Tão pouco contribuirá
para criar um ambiente de concórdia, no qual a sociedade como um todo possa
procurar um caminho, que será árduo e espinhoso, para com o tempo avançarmos
para uma "economia verde", que hoje é mais uma palavra de ordem do
que um objetivo conquistável.
O Brasil
terá um Código Florestal que impactará as áreas urbanas e rurais. Os prefeitos
não acompanharam esse processo e serão surpreendidos por exigências legais que
questionarão planos diretores, zoneamentos urbanos e códigos construtivos em
todo o País.
O novo
código começa mal e deverá ser remendado no curto e no médio prazos. A
avalanche de processos no Judiciário já está sendo anunciada, tanto por parte
dos agricultores vitimados, quanto por parte de ambientalistas e integrantes do
Ministério Público.
Todos
pretendem questionar até a constitucionalidade de determinados artigos. Com
este quadro, perdem os agricultores, os ambientalistas, o agronegócio, o meio
ambiente, a economia e a sociedade brasileira.
A mídia tem uma grande
responsabilidade nisso, na medida em que foi incapaz de fugir do emocionalismo
dos dois lados e promover uma cobertura técnica com a profundidade que a matéria
exige.
Não foram
raros os casos em que o leitor podia identificar a posição do pseudojornalista
sobre o tema já no lead da matéria
nem as entrevistas em que o jornalista oferece o "microfone" ao
entrevistado.
Não
questiona, não contesta, não atua como jornalista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário