quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

O bem não faz barulho e o barulho não faz bem


O galinheiro de ovos Fabergé

A peça de Eike Batista era falsa, mas o governo vende ilusões, e o contribuinte paga as contas dos grão-duques

Numa de suas operações espetaculosas, a Polícia Federal apreendeu na casa de Eike Batista um ovo do joalheiro Fabergé, o queridinho dos czares russos. Valeria US$ 20 milhões e revelou-se uma cópia barata, daquelas que se compram no eBay por R$ 60. Cão danado, todos a ele. 
Essa seria mais um prova das mistificações megalomaníacas do empresário. Problema: não há registro de que Eike tenha dito que aquele ovo era verdadeiro. Era apenas um momento de sonho. Uma pessoa poderia acreditar que ele tinha um Fabergé e sua vida não pioraria. 
Ferraram-se aqueles que acreditaram no seu império de portos, minas e campos de petróleo. Os Fabergé de R$ 60, bem como os pinguins de geladeira e as reproduções da Mona Lisa, não fazem mal a ninguém. 
O problema é outro, quando se acredita em grandes lorotas empacotadas pela sabedoria de governantes e opiniões de sábios. Eike Batista foi uma delas, mas há outras.
Veja-se o caso do que se chama de polo da indústria naval. Nos últimos 60 anos, os contribuintes brasileiros patrocinaram outros dois. A ideia é banal. Assim como sucedeu com a indústria automobilística, o Brasil poderia produzir navios. Primeiro veio o polo de Juscelino Kubitschek. Quebrou. 
Depois veio o da ditadura. Também quebrou. Com uma diferença: nele, os maganos transformaram seus papéis micados em moedas da privataria. Assim, um banqueiro que poderia ter quebrado investindo em estaleiros trocou o papelório pelo valor de face e comprou a Embraer. Agora está aí o polo do Lula, com suas petrorroubalheiras. 
Nenhum dos três polos navais deu certo porque, ao contrário de projetos similares de Japão, Coreia e Cingapura, no Brasil não se respeitaram metas, prazos ou custos. Uma pessoa pode ter um Fabergé de R$ 60 em casa, mas jamais acreditará que pelo tempos afora se poderá produzir navios que custam mais caro que os do mercado internacional.
Tome-se outro exemplo, noutra área. O governo criou o programa Fundo de Financiamento Estudantil, o Fies. Grande ideia: financia jovens que entram para universidades privadas, como se faz pelo mundo. 
Mexe pra cá, mexe pra lá, os empréstimos passaram a ser tomados sem fiador, a juros de 3,4% ao ano e entra quem pede. A Viúva paga e os donos das escolas recebem o dinheiro na boca do caixa. Uma beleza, o comissariado petista estatizou o financiamento das universidades privadas. Uma faculdade de São Caetano do Sul tinha 27 alunos em 2010, todos pagando suas mensalidades. 
Hoje tem 1.272 e só quatro pagam do próprio bolso. Essa conta está hoje em R$ 13,4 bilhões. O governo propôs duas mudanças singelas: só terão acesso ao Fies os jovens que tiverem conseguido 450 pontos no exame do Enem e as faculdades com bom desempenho. Sucedeu-se uma gritaria. 
Os repórteres José Roberto de Toledo, Paulo Saldaña e Rodrigo Burgarelli informam que, entre 2012 e 2013, o número de estudantes diplomados do setor público cresceu 2%, enquanto no setor privado caiu 7%. 
Já a evasão dos estudantes beneficiados pelo Fies cresceu 88%. Pergunta óbvia: um garoto que abandonou a faculdade vai devolver o empréstimo que tomou sem fiador? Resposta, também óbvia: para o dono da escola, não faz diferença, pois ele já recebeu o dinheiro da Viúva e sabe mexer seus pauzinhos no governo, o grande galinheiro de ovos Fabergé.

Elio Gaspari é jornalista

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