terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Ministro ligado à esquerda católica quer reativar Reforma Agrária




A ressurreição da reforma agrária?

Antônio Márcio Buainain

O programa de reforma agrária estava engavetado, morrendo lenta e indefinidamente, como ocorre com muitas instituições e políticas públicas no Brasil. Tudo indicava que este seria o destino da reforma agrária, cuja realização já estava fora da agenda do próprio governo federal. 

Mas o debate voltou, e animado! A ministra Katia Abreu declarou que não existe mais latifúndio no Brasil e que as intervenções fundiárias devem ser pontuais, com total respeito à legislação vigente que protege a propriedade privada. 

O ministro Patrus Ananias discorda ipsis litteris da colega e diz que o latifúndio existe e predomina no agronegócio brasileiro, que é preciso observar com mais rigor o caráter social da propriedade da terra e atualizar os índices de produtividade, parâmetros para as desapropriações. Prometeu reativar a reforma agrária.

Embora eu me identifique com a visão da ministra Katia, de que intervenções fundiárias, se e quando necessárias, devem ser pontuais e baseadas num novo modelo, o latifúndio — entendido como uma propriedade grande — existe, só que deixou de ser improdutivo e hoje é responsável por boa parte do crescimento do setor mais dinâmico da economia do País. 


É também evidente que continuam existindo terras improdutivas, só que essa situação já não corresponde ao domínio de proprietários rentistas e absenteístas que impediam o desenvolvimento do País.

Quem quiser buscar rentista deve olhar para as aplicações no mercado financeiro, com rentabilidade garantida pela própria política econômica, que continua favorecendo tais “investimentos” em detrimento da construção de um ambiente de negócios apropriado para estimular investimentos “produtivos”.

Terras “improdutivas”, hoje, são quase sempre sinônimo de terras onde, nas condições vigentes, não dá mesmo para produzir. É, ainda, evidente que ainda existem trabalhadores sem terras, parceiros e arrendatários que gostariam de ser proprietários e demandam terras. 

Resta saber por que essa aspiração, legítima, deve ser atendida à custa do direito de legítimos proprietários de terras, que procuram produzir da melhor forma possível, muitas vezes em condições adversas provocadas pela própria política pública.

Também é certo que existem pobreza e violência no meio rural, que milhões de famílias ainda vivem em insegurança alimentar, que temos problemas com índios, quilombolas e outros que só serão equacionados com políticas de desenvolvimento sustentáveis, sólidas e consistentes, e não com discursos e puras políticas assistencialistas. 

Portanto, não é a ausência de problemas que justifica a “desnecessidade” da reforma agrária, mas sim o fato — constatado pela própria experiência brasileira após ter assentado 1,2 milhão de famílias sem impactos positivos significativos — de que a reforma agrária, reivindicada e concebida nas décadas de 50 e 60, não é hoje resposta eficaz para nenhum dos problemas do meio rural nem do Brasil.


*Antônio Márcio Buainain é professor de Economia da Unicamp

 Fonte:O Estado de S. Paulo

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